quinta-feira, 25 de abril de 2019

Vingadores - Ultimato

Numa das cenas que abrem esta continuação praticamente direta de “Vingadores-Guerra Infinita”, vemos Tony Stark gravar um melancólico monólogo diante do capacete da armadura com a qual ele foi o Homem de Ferro –cena esta vista e revista em diversos trailers.
A referência à Hamlet, de Shakespeare, é clara, bem como também é clara a similaridade entre a ambientação soturna da nave –Stark está à deriva no espaço –com a caverna onde ele construiu sua primeira armadura, dando o primeiro passo para o surgimento do que é hoje conhecido como o Universo Marvel dos cinemas.
A cena mostra assim os dois elementos primordiais que os diretores Anthony e Joe Russo tratarão de manter impecáveis ao longo das avassaladoras três horas de duração de “Vingadores-Ultimato”: A referência do mais altíssimo nível a que se pode chegar –em termos técnicos, dramáticos e artísticos, inclusive –e uma compreensão insolúvel de que o passado embutido em toda a cronologia cinematográfica da Marvel Studios deve não só ser recordado, mas também, levado em consideração, apreciado e, no fim, louvado.
Ao dar continuidade aos eventos arrebatadores de “Guerra Infinita”, “Ultimato” imbrica por um caminho que a Marvel e nenhum outro estúdio encontrou meios até então de trilhar: O de um legado composto ao longo de 11 anos de produções cinematográficas, em meio aos quais ele corajosamente percebe a importância de encontrar um fim.
Sim, porque, preservadas as surpresas que a obra reserva –e, meu Deus, elas são muitas! –“Ultimato” é, antes de mais nada, um encerramento. Um desfecho de uma história que num único empuxo narrativo se iniciou com o astro Robert Downey Jr. e seu encaixe absurdo com o personagem de Tony Stark/Homem de Ferro no primeiro filme do estúdio, e prosseguiu num expansão sem precedentes dessa mitologia nos filmes “Thor”, “Capitão América-O Primeiro Vingador” e, na junção audaciosa e vibrante dessas linhas narrativas em “Vingadores”; que, em sua cena pós-crédito, introduzia pela primeira vez o grande vilão Thanos, interpretado aqui com eficiência incontestável e empatia amedrontadora pelo ótimo Josh Brolin.
Foi em torno da promessa da vinda de Thanos que a Marvel Studios construiu assim o fio condutor a unir todos os trabalhos que se seguiram –e que oscilavam entre excelente entretenimento e diversão descompromissada –em meios aos quais não tardaram a destacar-se as obras assinadas pelos Irmãos Russo.
Pelas mãos deles, o Capitão América logo assumiu uma posição existencialmente central nesse Universo Marvel, no magnífico “Soldado Invernal” e depois no brilhante “Guerra Civil”.
A demonstração de habilidade incomum dos Russo prosseguiu com o espetacular “Guerra Infinita” e, por fim, a revelação de Thanos como o mais complexo vilão já concebido pelo estúdio. O que nos leva a este “Ultimato”.
Incapazes de lidar com o fato de que o vilão os derrotou e sobrepujou –agonia que os fãs também experimentaram durante o ano inteiro que separam estes dois filmes –os Vingadores remanescentes (e que correspondem, por sua vez, à formação original vista no primeiro filme) unem-se num plano derradeiro para tentar um contra-ataque; estimulados pela aquisição da poderosa Capitã Marvel (Brie Larson).
Este é o ponto de partida do filme e corresponde a tudo que dele se pode falar sem entrar no terreno pantanoso e arriscado das surpresas, pois sua trama é repleta de reviravoltas inesperadas, e ramificações que se mostram mais complexas do que poderia se supor num filme de orientação tão comercial, conduzindo o expectador a uma meia hora final que está entre os mais assombrosos e embasbacantes momentos do cinema comercial de todos os tempos.
O que importa, porém, é que por trás da expectativa absurda que a Marvel conseguiu gerar no público –e do filme emocionante e arrebatador que criou para correspondê-lo –“Ultimato” é, no fundo no fundo, uma declaração de amor.
Ao legado extraído de décadas de quadrinhos e transposto com apaixonada propriedade para a tela de cinema. Aos fãs, que converteram as produções da Marvel em sucessos simultâneos de bilheteria (e que certamente transformarão este num novo fenômeno). Aos personagens e seus intérpretes que se revelaram, em sua esmagadora maioria, de um acerto fenomenal –e aqui, apesar de todas as presenças esplêndidas que se seguem (com destaque para Chris Evans e Jeremy Renner) não dá para não chamar Robert Downey Jr. à frente.
Ele é o princípio de tudo. O marco zero. E é nele, mais uma vez, que se ampara a escolha para encerrar esta jornada de 22 filmes. Ele foi (e sempre será) Tony Stark, o personagem que acendeu o estopim para um legado sem precedentes no cinema comercial, e ele é aqui aquele que, num dos momentos mais superlativos e emocionantes, executa enfim sua manobra final.
“Ultimato” é cinema como aquilo que ele deveria ser: Emocional, visceral, divertido (mágico, até!), arrebatador e espantoso em níveis que a indústria (e a própria Marvel Studios) encontrarão dificuldades de igualar nestes anos por vir.
Tê-lo nas salas de cinema é um privilégio.

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