quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

O Último Entardecer

As câmeras do diretor Wayne Wang parecem dispostas e justapostas, prontas para tentar registrar o sentimento de urgência que dominava Hong-Kong, em 1996-7, quando se deu a transição de seu então domínio inglês (durante o qual tornou-se um pólo de atividade econômico-capitalista) de volta para suas raízes com a recuperação para a China.
Nessa intenção à uma fusão dos dois estilos quase antagônicos que Wang difundiu em seus mais reconhecidos trabalhos: A improvisação orgânica entre a câmeras e os atores, típica de “Cortina da Fumaça” e particularmente sua continuação, o filme-colagem “Sem Fôlego”; e o tom dramático de vibração clássica, mas de insuspeito charme sedutor, que se percebe em “O Clube da Felicidade e da Sorte”.
Como naquela obra, são as mulheres quem potencializam e catalizam toda atenção e interesse do expectador –e aqui elas são a deslumbrante Gong Li, e uma ainda jovem Maggie Cheung, que quase rouba o filme numa mal aproveitada trama paralela.
Mas, infelizmente, Wang nomeia como protagonista o jornalista inglês interpretado por Jeremy Irons –e começam aí alguns de seus problemas.
Parece ser pouco envolvente a trama que o coloca no centro de todas aquelas mudanças, e a fleuma de enfado britânico com a qual Irons usa na composição de seu personagem –e que ele soube modular com exemplar precisão em outras obras –não ajuda em nada neste caso.
Isso não se intensifica nem quando John, seu personagem, um correspondente inglês cobrindo os acontecimentos em Hong Kong, descobre sofrer de leucemia, o quê lhe tolherá a vida em poucos meses.      
Sua grande frustração é, portanto, não ter mais tempo para resolver seus assuntos pendentes, sobretudo, os afetivos, que dizem respeito diretamente à Vivian (Gong Li e sua beleza incontornável), imigrante chinesa e dona de um bar no centro da cidade, por quem o coração de John já está enredado, mas que o rejeita sistematicamente devido à pouca estabilidade que ele representa; ela, na realidade aguarda, numa vã esperança, o pedido de casamento de Chang (Michael Hui), seu amante e um homem de negócios ascendente em Hong Kong.
Vivian, então, simboliza Hong Kong cujas raízes históricas e culturais –e outras razões que na maioria das vezes, nem ela sabe dizer quais são –a impelem na direção de Chang (a China para a qual Hong Kong está prestes a voltar), e a afastam, traduzidas em forças poderosas do destino, cada vez mais do apaixonado John (a Inglaterra que, com todas as suas boas intenções, levou a própria Hong Kong e seu povo a experimentar os extremos violentos de seu sistema econômico).
Seria uma metáfora cheia de graça e primor não fossem algumas escolhas equivocadas. A pior delas: O absolutamente sem graça, sem sal e sem carisma Michael Hui que, como Chang, prejudica até a bem construída personagem de Gong Li –o expectador passa o filme inteiro a se perguntar o porque daquela bela mulher preferir aquele chinês desinteressante, tacanho e apático no lugar do sempre vistoso e elegante Jeremy Irons –mesmo que ele não esteja em seus melhores dias. Ou talvez, sendo esta uma obra feita para e pelo Ocidente, fosse essa mesma impressão o objetivo almejado.
Antes o objetivo fosse fazer um grande filme.

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