Por volta de seus treze anos, uma jovem começa
a aflorar para a vida sexual. Tal fato –nunca realmente explicitado –é
percebido através de simbolismos que surgem já nas cenas iniciais (uma gota de
sangue maculando as pétalas brancas de uma margarida). A aparição de uma trupe
circense em sua cidade parece potencializar isso –inclusive pelas inúmeras
possibilidades que essa interpretação proporciona.
Na calada da noite, essa jovem, Valerie, tem
seus brincos de pérola roubados por Orlik, que depois arrependido os devolve.
Os brincos serão uma espécie de amuleto para ela, ao longo de toda a surreal
trajetória do filme.
Valerie mora com a avó –de uma perene expressão
cadavérica e sempre ostentando aquela secular atitude de adultos que acham ter
uma resposta para todas as coisas, mesmo aquelas que eles próprios desconhecem
–e em sua rotina estão as habituais idas à igreja, onde o padre lhes confronta
com contradições ainda mais explícitas do que normalmente seriam: Numa
peregrinação com freiras, eles tentam tampar, em vão, os olhos de todas as
meninas para que não vejam um casal que faz sexo selvagem em frente a todas
elas (!).
(E a Igreja, neste filme é uma fonte constante
de tópicos a ganhar questionamentos, inclusive com uma deliberada encenação de
um pesadelo da Inquisição.)
Logo, Valerie descobrirá que um desses padres
é, na realidade um vampiro, símbolo das perversidades disfarçadas de preceitos
religiosos, e sua maldição em breve contaminará sua avó, que ressurgirá
rejuvenescida, pronta para sugar o sangue da própria Valerie.
Esta por sua vez, irá se encantar cada vez mais
por Orlik, que revela-se ao longo da trama uma presença quase angelical, de
providenciais intervenções salvadoras quando Valerie mais precisar. Mas uma
revelação poderá ameaçar a idealização do romance: Ele e Valerie são irmãos,
ainda que a jovem pouca atenção dê a esse fato (!!).
Essa sinopse pouco ilustra este imensamente
enigmático filme tcheco, um dos raríssimos exemplares do Movimento Surrealista
de Cinema da Tchecoslováquia realizado nos anos 1970 a ser lançado no Brasil.
Na maioria das vezes, as imagens falam por si (e esse empenho visual se
justifica no fato de que é difícil elucidar um único significado aparente de
muito do quê se vê, como a própria imagem da avó, talvez uma metáfora de que,
embora hajam perigos indeléveis no ato de crescer e amadurecer –e provavelmente
é isso que são os vampiros e sua oferta de sangue –é também terrível, e
até perigoso negar esse amadurecimento, forçando uma pureza e castidade que não
passam de mentiras), e os diálogos são reduzidos por vezes ao mínimo
necessário, ainda que a narrativa drene o sentido de quase tudo que é dito.
A maior audácia do filme do diretor Jaromil
Jires, é ousar colocar a sua jovem protagonista (Jaroslava Schallerová, de
beleza e carisma anormais) em cenas de nudez, de acentuada sugestão sexual e
até de lesbianismo (!!!), algo que hoje em dia renderia um barulho desgraçado,
mas aqui estamos nos lisérgicos anos 1970, e na Europa as coisas eram mais
liberadas mesmo...
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