segunda-feira, 10 de julho de 2017

Carne Para Frankenstein

Em 1973, o diretor Paul Morrissey, adepto das transgressões artísticas que concebeu em parceria com o vanguardista Andy Warhol, realizou esta versão de “Frankenstein de Mary Shelley” com forte inclinação para o gótico carregando nas tintas eróticas, questionadoras e artisticamente subversivas. O resultado é um filme que desde o início toca em inúmeros tabus, a começar pelo detalhe do Barão de Frankenstein (vivido por Udo Kier, com afetadíssimo sotaque europeu, e atitudes de um dândi arrogante presunçoso) ser casado com a própria irmã (!), a Baronesa Katrin (Monique van Vooren, estranhíssima com as sobrancelhas completamente raspadas), e com ela ter um casal de filhos.
Indo de encontro à noção popular –que em geral relaciona “Frankenstein” à figura do monstro e não do cientista, que é quem, afinal, leva o nome –o filme não mostra a Criatura (não, pelo menos, como se espera) e concentra-se nas experiências radicais e plenamente amorais do Dr. Frankenstein: Para tanto, ele precisa de partes de corpos a serem enxertados em seus arremedos de seres vivos na construção de uma “nova raça”.
Ao lado de seu sádico assistente Otto (Arno Juerging), ele coleta o que necessita entre os cadáveres da aldeia, ou faz vítimas entre os incautos camponeses. Um deles (Srdjan Zelenovic), atende com perfeição aos requisitos para compor seu monstro “macho” –o monstro “fêmea”, vivido pela belíssima Dalila Di Lazzaro, serve ocasionalmente para suprir as perversões do cientista e seu assistente (!) –mas, é amigo de Nick (Joe Dalessandro, espécie de objeto do desejo para o fascínio gay do diretor), que não descansa até descobrir seu paradeiro; nesse ínterim, ele se torna empregado e amante da Baronesa –em cenas que exploram mais a nudez dele do que a dela.
É, portanto, uma mescla, característica de seu período libertário, de filme de horror sangrento e provocativo com uma premissa de diversos interlúdios sexuais, lembrando bastante –com um pouco mais de pretensão artística –as obras que fizeram a fama do diretor B, Jess Franco.
O desfecho é também muito indicativo do caráter transgressivo com o qual os realizadores encaravam suas obras: Longe de vislumbrar um final feliz, o personagem Nick assiste à todos os demais personagens se matarem (alguns de forma bem cartunesca e absurda), para então restas apenas o casal de filhos do barão –que protagonizam a cena de abertura, um prólogo deste momento derradeiro.
Ao contrário do que se esperaria, as crianças não o soltam, preferindo mantê-lo preso, cobaia das experiências que eles mesmos perpetrarão: As crianças darão assim continuidade àquela atividade hedionda, e possivelmente retomarão a relação incestuosa dos próprios pais.
Um filme de terror tão sangrento quanto provocante, completamente alheio às definições de ‘normal’.

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