segunda-feira, 5 de março de 2018

Há Tanto Tempo Que Te Amo

A atriz Kristin Scott-Thomas construiu uma carreira desigual devido à trajetória inusitada que teve: No início, seu considerável talento aliado a uma beleza das mais atípicas pareciam destiná-la a ser a eterna coadjuvante em trabalhos como “Lua de Fel”, “Quatro Casamentos e Um Funeral”, “Ricardo III”, “Anjos e Insetos” e “Missão Impossível”. Uma virada ocorreu, ainda na metade dos anos 1990, com uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz por “O Paciente Inglês”; de repente, Kristin tinha um status de estrela inédito em sua carreira. Seguiram-se papéis em produções hollywoodianas ao lado de galãs maduros como “O Encantador de Cavalos” (com Robert Redford, dirigindo inclusive) e “Destinos Cruzados” (com Harrison Ford) alternados com projetos sérios, elitistas até, como “Assassinato em Gosford Park”.
É perceptível que, com o passar do tempo, Kristin deixou de lado o cinema mainstream para se concentrar em obras mais alternativas, oriundas muitas vezes da Europa –prova disso é a quantidade baixa de filmes seus que chegaram a ser lançados no Brasil.
Uma atriz interessante que soube como continuar interessante.
Dentre os filmes estrelados por ela na última década, se destacam aqueles que ela fez em parceira com o diretor Philippe Claudel.
“Há Tanto Tempo Que Te Amo” –que foi indicado ao Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro e deu a Kristin uma indicação de Melhor Atriz Dramática –surpreende de imediato ao mostrá-la falando um francês fluente e expressando muito bem, nesse outro idioma, as sutilezas dramáticas que a definem como atriz.
Quando o filme começa, Juliette, sua personagem, aguarda num aeroporto. Há uma expressão de desalento em seu rosto –não é mera impressão: Essa expressão sempre a acompanha.
Juliette voltou ao convívio com a irmã Léa (Elsa Zylberstein, até bem parecida com Kristin) que não via há anos. Léa se esforça para superar o desconforto de ambas não se conhecerem tão bem para fazer com que Juliette se sinta em casa. Léa mora com o marido Luc (Serge Hazanavicius), com as duas pequenas filhas adotadas e com o sogro, que um AVC emudeceu.
São as dúbias impressões de Juliette e Léa acerca uma da outra, porém, que a câmera intimista de Claudel quer capturar de verdade. Tais impressões vão se refletir na dinâmica da relação dela com as crianças e com o marido, mas acima de tudo, na dúvida que aos poucos a narrativa vai impor ao expectador: Mas, afinal, o que aconteceu no passado de Juliette?
As respostas dessa e de outras questões chegam aos poucos intercaladas por uma condução serena e parcimoniosa, dispersa o suficiente para dar devidamente tempo ao expectador para absorver as informações (algumas um bocado contundentes) que chegam.
Trata-se de um drama doméstico, de ambientação e vibração cotidiana, mas bem executado e bem interpretado, atento aos pequenos detalhes que a encenação vislumbra de forma tão sublime –e, por meio deles, Claudel também captura a metamorfose de Juliette, da pessoa amargurada e isolada da cena inicial, a alguém mais afetuosa e familiar.

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