sexta-feira, 2 de março de 2018

Uma Linda Mulher

Se o fato da produtora Touchstone Pictures (subsidiária da Disney) já não é indicativo da inapelável transfiguração da realidade crua em um conto de fadas promovida por este filme, grande sucesso no final dos anos 1980, a sua própria premissa já se encarrega de deixar bem claro: Vivian (Julia Roberts, no auge de seu encanto e seu esplendor sexual) é uma prostituta do Hollywood Boulevard. Apesar dos elementos e códigos das ruas sugeridos, sobretudo, em seus primeiros quinze (e mais mundanos) minutos, Vivian é uma alma, digamos, pura tentando sobreviver ao lado da melhor amiga, e igualmente prostituta, Kit (Laura San Giacomo, de “Sexo, Mentiras e Videotape”) no mundo cão.
Como costuma ocorrer com toda garota sonhadora, Vivian tropeça de forma cuidadosamente descuidada em seu príncipe encantado: Edward (Richard Gere, no ponto ideal de saturação para ser galã) é um empresário ricaço, solteiro e, por um acaso do destino e dos roteiristas, está perdido com uma Ferrari nas ruas de L.A. –e o filme de Garry Marshal segue nessa pegada tão idealizadamente descarada porque o público e a crítica dos anos 1980 eram ingênuos o suficiente para deixar-se encantar com seu trabalho.
É lógico que Vivian –prestativa que só –irá ajudá-lo com esse transtorno (o de achar o hotel cinco estrelas adequado), e por tal auxílio, Edward a contratará para ser sua “acompanhante” até o fim de semana. Nada de sentimentos. Nada de planos futuros. Apenas a garantia da remuneração de 5 mil dólares –o quê era para ser, diga-se, o título original do filme, antes dos produtores notarem que a música clássica de Roy Orbison, “Pretty Woman”, tinha tanto a ver com a produção!
Ao longo desse fim de semana, é claro que Vivian irá se revelar –à Edward e ao expectador –todo o fascínio de garota que ela é (uma síntese genuína e encantadora entre a Cabíria de Julietta Massina e o fulgor de Marilyn Monroe), o quê levará o casal protagonista a se apaixonar.
Há méritos inquestionáveis também na agridoce condução de Marshal, graciosa para a comédia, elegante para o drama, inebriada de bom gosto para o romance. Toda essa desenvoltura ajuda muito a atravessar momentos que poderiam soar terrivelmente pedantes (como o manjado final feliz), mas que na narrativa minuciosamente bem calibrada –e encenada por um casal principal pleno de química –ficaram cativantes e arrebatadores aos olhos de toda uma geração de fãs.

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