quinta-feira, 1 de março de 2018

As Duas Faces de Janeiro

Emanando uma nítida vontade de se provar, como todo o diretor iniciante, e uma imensa disposição em emular os grandes trabalhos de Alfred Hitchcock –em especial o maravilhoso “O Homem Que Sabia Demais” –o diretor Hossein Amini (mais lembrado como o roteirista de “Drive”) imprime desde o início uma atmosfera de desconfiança que seus personagens mal conseguem disfarçar por trás de sua estampa de casual casal norte-americano em viagem na cidade de Atenas, Grécia, em 1962.
Isso mesmo antes do acontecimento que detona o ponto de partida da premissa tirada do livro de Patrícia Highsmith (autora de “O Talentoso Ripley” e “Carol”): Chester e Colette MacFarland (Viggo Mortensen e Kirsten Dunst) aparentam ser meros turistas, e com isso chamam a atenção de Rydal (Oscar Isaac), um guia turístico, norte-americano como eles. Não falta a Rydal malandragem e flexibilidade moral para sobreviver tão longe de casa, e com inúmeras segundas intenções em mente ele se aproxima do casal.
Quando menos espera, porém, ele se descobre envolvido inadvertidamente nas encrencas de Chester que o seguiram até ali; um detetive particular, contratado por investidores indignados nos EUA, o confronta com suas dívidas a saldar, e Chester reage com violência, terminando com um cadáver em mãos e obrigando, ele e Colette a fugir junto de Rydal, que por puro acaso tomou conhecimento de tudo.
Acompanhando lentamente essa tentativa gaiata de fuga, o diretor Amini vislumbra uma ciranda de suspeitas e meias verdades. Chester não revela por inteiro toda a verdade para Colette, e o processo de manter as aparências diante da aflitiva situação o extenua; Rydal usa de subterfúgios para ficar por perto do casal e lucrar, além de manifestar um crescente interesse na mulher; já Colette dá corda à atração de Rydal, a despeito da impaciência crescente do marido, pois essa é sua maneira de manter algum controle numa situação em que pouco a pouco tudo começa a se descontrolar.
Dos três é Chester que irá se ressentir das circunstâncias desfavoráveis e sucumbir por primeiro ao desespero –registrado com a eficácia habitual do talentoso Viggo Mortensen.
Da tensão resultante, o diretor extrai o suspense que define seu filme e reitera a tragédia corrosiva que se abate na jornada deles. Fica longe de igualar qualquer obra de Hitchcock, mesmo as menores, mas resulta num entretenimento válido e sólido que recria até que bem a sensação que se tem ao ler um enxuto e elaborado conto pulp.

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