quarta-feira, 13 de novembro de 2019

O Terminal

Tão espetaculares foram as colaborações entre o diretor Steven Spielberg e o astro Tom Hanks (“O Resgate do Soldado Ryan”, “Prenda-Me Se For Capaz”, “Ponte de Espiões” e “The Post-A Guerra Secreta”, além da minissérie “Band Of Brothers” que produziram juntos) que, em meio à elas, o descompromissado “O Terminal” parece ter sido realizado por outra pessoa.
Spielberg deixou um pouco de lado o cinema adulto que tem predominado em suas obras nas últimas duas décadas para experimentar um gênero de difícil manejo, cujas complicações de ordem narrativa não costumam ser levadas em conta por público e crítica: A comédia.
A situação que envolve o personagem de Tom Hanks, Viktor Navorski, e que define do início ao fim o filme que ele protagoniza, não deixa de representar uma sutil referência às mazelas geopolíticas ocasionadas no Leste Europeu –mas, sua abordagem não poderia ser mais breve; Spielberg, aqui, quer fazer rir e entreter.
Ao chegar ao Aeroporto Internacional John F. Kennedy, em Nova York, local de trânsito constante e ininterrupto de turistas vindos do mundo todo, Viktor se depara com uma circunstância insólita: Durante seu voo, o país ao qual ele pertence, Krakozhia, sofreu um golpe de estado deixando, portanto, de existir como nação reconhecida aos olhos da ONU.
O que isso significa para Viktor? Que seu passaporte se tornou assim inválido (ele não pode cruzar os portões do aeroporto e pisar oficialmente em solo americano), bem como também se tornou uma espécie de expatriado (sem voos de retorno para Krakozhia, ele também não pode voltar para casa).
Dessa forma, Viktor não tem escolha a não ser viver no ambiente do terminal do aeroporto, o único lugar onde sua incomum situação permite que ele fique.
E o cenário predominante no filme –que quase se torna um dos seus personagens –é uma façanha da parte dos técnicos de direção de arte: O terminal é um local diversificado, preenchido de uma pluralidade demográfica espantosa, de um movimento e uma atmosfera orgânica e viva. É muito fácil ser iludido e presumir que Spielberg capturou aquelas cenas num terminal verdadeiro ao invés de ter recriado tudo em estúdio (que foi o que aconteceu). A magia do cinema só deixa evidente a artificialidade da encenação quando notamos que Spielberg lança mão de movimentos de câmera sofisticados e elaborados demais para uma filmagem feita em locação.
Uma crítica comum a “O Terminal” é que Spielberg já havia chegado num ponto em que era um diretor arrojado demais, cinematográfico demais, para tão modesta premissa –e esse argumento se reflete, sobretudo, no fato de que ele não consegue impedir o filme (bem longo) de extrapolar as duas horas de duração –no entanto, o diretor conduz com autêntica satisfação essa trama cheia de galhofa sobre um homem jogado numa cilada cujos tons absurdistas remetem à algumas obras dos anos 1980, seja em sua ingenuidade, seja em seu non-sense.
Com seu talento sem igual para o humor, Tom Hanks explora magnificamente as possibilidades cômicas que se constroem, numa oportunidade rara para divertir o público, tão constantes foram os projetos dramáticos que ele assumiu nos últimos anos.
E de fato, o protagonista e o ator que o interpreta respondem pelo que de mais genuíno e eficiente o filme tem: Como é inerente à camaradagem com a qual Spielberg enxerga seus personagens, Viktor logo encontra grandes amigos e aliados em meio à fauna de funcionários do terminal, como Enrique (Diego Luna), que lhe fornece comida desde que obtenha algumas informações sobre a bela mocinha do guichê de imigração por quem é enamorado (Zoe Saldana, antes dos sucessos de “Avatar” e “Guardiões da Galáxia”); e o desaforado zelador indiano Gupta (Kumar Pallana); além de alguns inimigos, sobretudo, o chefe de segurança do aeroporto (Stanley Tucci) que o vê como uma pedra no sapato.
Na narrativa que compõe, Spielberg não demora a enxergar o terminal como um microcosmos do mundo e da vida onde tudo nele acontece –não chega a ser surpreendente, assim, que por lá Viktor também encontra o amor nas formas da comissária de bordo vivida por Catherine Zeta-Jones (que demonstra menos química com Tom Hanks do que se poderia esperar).
No cômputo geral, “O Terminal” é um filme agradável e correto, o quê para o que se espera de um filme dirigido por Spielberg e estrelado por Hanks é quase uma frustração.

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