quinta-feira, 9 de julho de 2020

Um Longo Fim de Semana

Anos 1970. Embora poucas de suas produções fossem realmente capazes de romper o circuito comercial restrito de seu próprio território, o cinema australiano experimentava uma ebuliente convulsão de realizações de apelo comercial e culturalmente peculiares.
As obras voltadas mais para o terror logo foram chamadas de ozploitation, ganhando uma conjugação que as aproximava com outras vertentes que surgiram em outras partes do mundo, como o exploitation, o blaxploitation ou o giallo.
Dessa safra, o bucólico e macabro “Um Longo Fim de Semana”, de Colin Eggleston, traz a honraria de ter sido premiado no Festival de Cinema Fantástico de Avoriaz em 1978.
Nele, acompanhamos nada mais do que dois personagens, Peter (John Hargreaves) e Marcia (Briony Behets), num casual passeio à uma praia deserta num fim de semana. É também um exercício de sugestão do diretor Eggleston que emprega a narrativa –um tanto lenta e silenciosa –numa analogia da crise amorosa do casal, a respeito do qual informações vão surgindo aos poucos na tela: Briony está ressentida, pois Peter a obrigou a realizar um aborto, e o passeio, sob pretexto de recuperar seu relacionamento, atende mais às aptidões dele, egoísta e valentão, que às dela, urbana e doméstica.
Uma vez encontrando, com certa dificuldade o lugar –indícios que já presumem a complicação deles em achar o caminho de volta –Peter e Marcia se instalam no lugar com seu desleixo e seu descaso pelo meio ambiente, largando detritos onde querem, e destruindo fauna e flora; numa cena em questão, Marcia pergunta a Peter porque ele golpeia uma árvore com um machado e sua resposta é “Porque não?”.
Tal ato não passará impune. O diretor Eggleston, apegado aos expedientes do terror, enfatiza nos pequenos detalhes os rumos obscuros e inevitáveis que tudo terá: Ainda no início, Marcia assiste um noticiário relatando o ataque de krakatuas a algumas residências australianas, numa alusão poderosa à “Os Pássaros”, de Hitchcock, e num forte prenúncio do que virá.
O casal protagonista também não colabora muito: Exemplos inconsequentes da negligência humana para com a natureza, os dois só manifestam interesse para com os minimalismos melindrosos da própria relação (mostrada como defeituosa nas cenas iniciais) e já aparecem atropelando um canguru (!), jogando bitucas de cigarro nas margens da estrada (que logo incendeiam a relva) e demonstrando flagrante indiferença para com o lixo que produzem.
A mensagem acaba sendo clara: Na falta completa e deliberada de empatia desses desprezíveis personagens principais com o expectador, o filme de Eggleston tem por premissa dar-lhes o castigo que merecem. E desde o momento em que chegam à floresta à beira da praia, todos os elementos da natureza promoverão uma gradativa retaliação contra eles; Peter é atacado por uma águia, logo depois, por um gambá (!). os atritos com Marcia não cessam e ela se exaspera com a visão de uma criatura negra nas águas da praia, com as atitudes pouco cúmplices de Peter e com o fato de sempre querer voltar para casa –pedido que seu marido encontra pretextos banais para negar.
É curioso que, embora a natureza se volte claramente contra eles, neste filme um tanto simbólico das intenções de seu diretor e do cinema característico a que pertence, o derradeiro desfecho é reservado, para cada um, na forma de tragédias oriundas do próprio mundo moderno de onde vieram: Para Marcia, parte de um engano do próprio Peter envolvendo o uso imprudente de um arpão; para Peter, é quando ele encontra, após tortuosa procura, o rastro de volta para a civilização –a estrada –na qual tem seu irônico fim.
Amparado numa direção de fotografia e num desenho de som plenos de qualidade, o diretor Eggleston dá aos desenlaces mais triviais envolvendo a natureza que os cerca um viés de perigo iminente e incomum, potencializando o clima tétrico, embora também opte por dispersar sistematicamente esse efeito tornando o filme excessivamente contemplativo.

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