segunda-feira, 19 de abril de 2021

A Escola da Besta Sagrada


 Profano. Este é o adjetivo mais recorrente quando assistimos “A Escola da Besta Sagrada”, todavia, se para os ocidentais soa incômoda a miscelânea visual de elementos religiosos com sadismo e erotismo, os orientais, por sua vez, num país como Japão, de minoria católica, tinha (e tem) realizadores que podem se dar ao luxo de tratar do tema com iguais ousadia e despreocupação.

Nos anos 1970, quando o chamado exploitation passou a contaminar a produção mercadológica de estúdios mais picaretas, logo surgiram virações de sub-gênero no que tange ao uso da pornografia e da violência; um deles era o nunsploitation, no qual freiras eram frequentemente filmadas em cenas de sexo e de nudez, uma forma de enfatizar a perversão potencial e latente por trás de uma postura tão austera –com efeito, filmes dessa natureza acabaram se tornando bem comuns em nichos específicos.

Dirigido por Norifumi Suzuki, “A Escola da Besta Sagrada” era um produção que reservava pouco à imaginação, saciando a avidez pervertida de seu público com sucessivas sequências libidinosas e chocantes, contudo, o elemento que o tornou inesperadamente perene foi sua atriz principal: Yumi Takigawa se tornou, poucos anos depois, uma estrela no Japão e, com o status alcançado, podia vetar cenas explícitas em seus filmes, o que tornou “A Escola da Besta Sagrada” –e as cenas extasiantes de nudez que ela protagoniza –uma espécie de preciosidade!

Yumi Takigawa interpreta a jovem Mary que, na cena inicial, passeia pela Europa, inclusive num encontro sexual com um pretendente. Tão logo os créditos transcorrem, porém, essa ambientação muda radicalmente. Das ruas agitadas e permissivas do Ocidente, vamos para um convento no Japão, onde Mary se torna uma das freiras recém-admitidas.

Entretanto, a fachada de moralismo (e de hipocrisia) mantida no convento não tarda a revelar fissuras: Lá, há de tudo um pouco! As freiras praticam lesbianismo (!) e, com frequência, burlam as leis cristãs para poderem pecar (!!), impelidas por desejos incontroláveis.

Quando descobertas, os castigos espelham a mesma audácia: As pecadoras são amarradas, nuas –ora com correntes de ferro, ora com galhos espinhosos –e açoitadas com requintes sádicos pela Madre Superiora Adjunta e suas seguidoras.

Há um fiapo de trama –que começa a ganhar mais estatura na segunda metade –onde vemos a história de Mary ser melhor esmiuçada: Descobrimos que ela é filha de outra freira, Mary Michiko, daquele mesmo convento, e que sua morte tem relação direta com o diretor todo-poderoso do convento, o Padre Kakinuma (Fumio Watanabe), uma espécie de versão nipônica do Monge Rasputin, controlador, sórdido e cruel.

Na caligrafia de simbolismos desvendada por Norifumi Suzuki, o Padre Kakinuma –cujo dorso ostenta deformações causadas pela bomba atômica –é uma consequência do ataque nuclear à cidade de Nagazaki, durante a Segunda Guerra Mundial: A cidade era um pólo de predominância católica, e sua destruição (bem como a degradação de valores demonstrada por esse antagonista), resultava numa trágica ironia em relação à essa inclinação ocidental.

Embora hajam apontamentos bastante evidentes e nada sutis dessa postura ao longo de todo o filme, é correto afirmar que as plateias que o conferiram, e que possivelmente o cultuam até hoje, pouco se importaram com os subtextos e suas entrelinhas: “A Escola da Besta Sagrada” é, sobretudo, uma realização obscura para se consumir um erotismo desregrado no qual os japoneses se revelam peritos em fetiches distorcidos e impraticáveis.

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