quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Gravidade

O período de intervalo entre o longa anterior de Alfonso Cuarón (o fenomenal e contundente "Filhos da Esperança") e este "Gravidade" foi de quase sete anos. E para quem, nas duas últimas décadas viu-se fascinado com as obras brilhantes que ele entregava aqui e ali, foi uma sentida ausência.
Desde o singelo e emocionante "A Princesinha" era perceptível que havia algo de muito especial na visão daquele jovem mexicano, tão interessado em movimentos de câmera pouco usuais, em uma paleta de cores sempre incomum, de inusitado apelo sombrio, visivelmente inclinado a planos sequências que pareciam muitas vezes desafiadores em termos técnicos, e adepto quase sempre, de uma elaborado processo de criação: Essas características intrínsecas e singulares não foram amenizadas nem quando ele assumiu a direção do terceiro episódio da série "Harry Potter"; e com ele terminou fazendo o melhor exemplar da saga.
Era, portanto, promissora a ideia do quê viria pela frente quando Cuarón não apenas enveredou uma vez mais pelo terreno da ficção científica, como também sua visão de como a trama se desdobraria era tão carregada de ineditismo e de audácia visual, que toda uma nova tecnologia precisou ser aprimorada para viabilizar as cenas.
Há que se honrar, em "Gravidade", não só o toque artístico de Cuarón nas cenas maravilhosas que se seguem uma a uma, mas uma sucessão de outros talentos, também eles superlativos: O autor da trilha sonora, Steven Price; a atriz Sandra Bullock, e sobretudo, o diretor de fotografia Emanuel Lubenski.
Todos são protagonistas desse esforço cinematográfico único que proporciona uma dos filmes mais ímpares a surgir nas telas em muitos anos.
Na trama, devido a uma incauta colisão com destroços de lixo espacial, a doutora Ryan Stone (Bullock) e o astronauta Walter Kovalsky (George Clooney, em curiosa e interessante participação) vêem-se numa situação impossível: Flutuando à deriva no espaço, eles devem encontrar um meio seguro de voltar para a terra, antes que seu oxigênio se acabe.
E pronto, a partir do simples e incisivo roteiro de Cuarón e seu filho, Jonás, está estabelecida a situação em torno da qual o filme reflete: A vida a tentar prevalecer, a despeito da mais improvável e inóspita das condições. 
Munido de momentos concebidos pela mais alta e refinada tecnologia, o talentoso diretor mexicano elabora para esse conto poderoso sobre a fé e a necessidade humana de sobreviver ante as adversidades extremas uma nova gramática cinematográfica, construindo sua narrativa a partir de planos longos que nos deixam curiosos sobre como teriam sido feitos, e instantes de silêncio, intercalados por uma vibração sonora que nos arrebata da cena. Sua investigação versa de maneira sublime sobre as crenças que norteiam a alma, e abrem espaço para um sem-fim de possibilidades, neste filme nunca menos do que fascinante.
Uma obra-prima técnica e artística agraciada com 7 merecidos Oscars.

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