quinta-feira, 12 de maio de 2016

MacBeth 1948 e 2015

Uma das mais aclamadas incursões do gênio Orson Welles pelos textos loquazes, dissertativos e virtuosos de Willian Shakespeare, “MacBeth” é também adaptada num filme mais recente dirigido, por sua vez, por um certo Justin Kurzel, e estrelada por Michael Fassbender e Marion Cotillard.
Em “MacBeth”, Shakespeare narra a jornada de equívocos, de crime e castigo do Lorde MacBeth, valoroso general a serviço do rei da Escócia, cujas sucessivas conquistas no campo de batalha lhe concederam não apenas a confiança do próprio rei, como o título de Barão de Cawdor. Logo no início, três bruxas (que também profetizaram o seu baronato) lhe afirmam que será, também ele, rei, o que fomenta a ambição crescente de MacBeth, impelida ainda mais pela sanha inescrupulosa de sua esposa, Lady MacBeth.
Ela vale-se de suas convicções e de seus inabaláveis argumentos para varrer a hesitação de seu relutante marido, e convencê-lo assim a assassinar o rei, enquanto este pernoita como hóspede em seu castelo, depositando a culpa em seus sentinelas.
Com o rei morto, MacBeth ocupa o seu lugar, conforme a profecia, mas seu suplício, mal sabe ele, está apenas por começar.
Um verdadeiro abismo de diferença separa a versão de Orson Welles da de Justin Kurzel.
Welles compreendia como poucos a dramaturgia de Shakespeare, e impõe a este trabalho sombrio uma série de tons expressionistas que reforçam as preposições alegóricas do conto original (exploradas também na pouco conhecida versão que Roman Polanski realizou em 1971), permitindo que esse domínio da linguagem cinematográfica quebre um pouco (mas, não muito) a perene circunstância de teatro filmado: Sim, pois em seus enquadramentos, disposição cênica e marcação de atores em cena, este “MacBeth” é magistralmente teatral.
Teatro, contudo, é tudo o que o filme de Kurzel quer evitar ser.
Ele quer ser cinema.
Nas elipses da natureza capturadas aleatoriamente como num improviso da direção de fotografia, na ambientação aberta que só um generoso orçamento permite, e na privilegiada escolha do elenco estelar, a produção busca esse objetivo, esquecendo inúmeros outros.
O quê Justin Kurzel não percebe é que Shakespeare requer ação, uma lição fundamental deixada pelo mestre Akira Kurosawa em seu inigualável “Trono Manchado de Sangue” (também ele, uma versão de “MacBeth”), mas que aqui é completamente esquecida: O tom empostado com que Marion, Fassbender e todo o resto declama os diálogos e monólogos do bardo não encontra moldura adequada na enfadonha narrativa de Kurzel que tira do texto toda e qualquer urgência com toneladas de takes dispersivos.
Mal dá para perceber a quanto Marion Cotillard está sucinta como a sibilante Lady MacBeth, embora Jeanette Nolan, no mesmo papel no filme de 1948, seja de uma perfeição incomparável.

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