As produções que Ang Lee assume parecem ser
desafios pessoais tamanha é a guinada narrativa, técnica e visual que
normalmente representam quando comparados uns aos outros.
Se em sua primeira fase, em Taiwan, ele
conquistou prestígio conduzindo ótimos dramas neo-realistas muito homogêneos
entre si, depois que passou a trabalhar no Ocidente –com sua estréia sendo
“Razão e Sensibilidade” –ele visitou as mais inesperadas e audaciosas
propostas; incluindo aí também o seu magnífico épico de artes marciais falado
em mandarim, “O Tigre e O Dragão”.
Nesse panorama –e certamente em meio à tão
exuberante filmografia –o projeto de “As Aventuras de Pi” não chega a ser tão
surpreendente, embora tenha cativado a crítica a ponto de Lee ganhar seu
segundo Oscar de Melhor Diretor (o primeiro foi por “O Segredo de Brokeback
Mountain”), embora ironicamente nenhum de seus trabalhos tenha levado o Oscar
de Melhor Filme.
Aos seus quarenta e tantos anos, o indiano
Piscine Molitor Patel (um inspiradíssimo Irrfan Khan) relata a um jovem
escritor (Rafe Spall) uma história inacreditável ocorrida com ele aos seus
quinze anos (então vivido pelo estreante Suraj Sharma): Quando sua família
deixou a Índia rumo ao Canadá levando consigo os animais do zoológico que
mantinham, o navio em que estavam afundou deixando o jovem Pi como único
sobrevivente ao lado de Richard Parker, um ameaçador tigre de bengala (os
companheiros iniciais dessa jornada, uma zebra, um rato, um orangotango e uma
hiena logo sucumbem) à bordo da limitada embarcação de um bote salva-vidas.
Se Richard Parker acaba sendo para Pi uma
preocupação a mais, ele também representa um incentivo poderoso para que ele
queira sobreviver.
Durante essa tortuosa jornada em alto-mar, o
garoto e o tigre experimentam inesperadas situações, narradas com distinção e
exotismo pelo diretor Lee, a medida que constroem uma espécie de vínculo
existencial.
A grande propriedade do trabalho de Ang Lee é o
modo com que administra, para efeitos dramáticos, os muitos recursos de que
dispõe para a construção desta sua aventura filosófica e alegórica: Realmente
saltam aos olhos o refinamento dos efeitos visuais (vencedores do Oscar) e o emprego lúcido e
inventivo dos efeitos 3D, ainda que o cinema americano tenha tantos grandes
exemplares neste quesito que “Pi” corre o risco de logo ficar datado.
No que diz respeito à trama, uma sacada
bastante interessante (mas, pouco aproveitada pelo roteiro) é a natureza dúbia
dos relatos de Pi: No trecho final é levantada a possibilidade de outra
história, mais trágica e verossímil, ter transcorrido e todo o enredo que envolve o tigre
Richard Parker ser uma fuga criada por ele da triste realidade.
Mas, a narrativa de Lee não se permite essa
divagação por muito tempo e torna a reiterar a trama que contou, valorizando os
efeitos visuais, os atores indianos maravilhosos que conseguiu e a beleza
etérea da jornada que narrou.
Faltou pouco para ser tão
genial quanto outros de seus trabalhos.
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