quinta-feira, 25 de maio de 2017

Faca Na Água

Conceitual, árido, autoral e por isso mesmo, magnífico, este conto sobre as disputas egocêntricas que o ser humano cria (às vezes, em sua própria mente), e um dos primeiros trabalhos de Roman Polanski, já deixava bastante evidente que o diretor polonês não estava para brincadeiras: Já estavam lá, desde o começo, sua inclinação para atmosferas sufocantes, a atenção às facetas mais questionáveis do ser humano, o humor negro calibrado à perfeição e sutileza, os jogos de natureza sexual.
O filme se inicia com um casal (Jolanta Umecka e Leon Niemczyk) num carro a caminho de uma laguna. Registrados num enquadramento assimétrico e frio (o mesmo com o qual o filme também se encerrará), percebe-se ali a falta de espaço que Polanski sugere para qualquer sentimento mais intenso; nunca fica claro quais são as complicações que se abatem sobre aquele casal, mas deduzimos ser um desejo que esfriou, ou um mero período de crise no relacionamento.
Talvez, seja justamente essa necessidade de uma ferramenta que lhes devolva alguma satisfação que leva os dois a convidarem, sem maiores motivos, um jovem (Zygmunt Malanowicz) que quase atropelam na seqüência para velejar com eles.
Durante o período em que os três permanecem no veleiro em pleno mar –e que corresponde à grande totalidade do filme –Polanski irá lançar um olhar agudo sobre as menores variações na dinâmica que se estabelece entre os três: Andrzej, o homem, logo cria, com o rapaz, uma camaradagem pontuada por rivalidade (onde a arrogância de Andrzej encontra espaço para tentar se impor); Krystyna, a mulher busca aparentar indiferença aos olhares ocasionais do jovem, apesar do visível deleite que isso lhe provoca; enquanto que o jovem, não raro, se vê como uma testemunha perplexa das rusgas e implicações do casal.
Gradualmente elevando a tensão inerente à essa situação, e ao fato daquele ser um ambiente absolutamente restrito –onde trocas de roupa e outras atividades corriqueiras adquirem um contexto pulsante, sexual e explosivo –a direção de Polanski elabora uma encenação elegante para as justaposições de atrito que inevitavelmente irão aflorar.
Como é de sua natureza –e veio a ficar bem claro nos filmes que fez depois –é o elemento sexual que parece surgir determinante na narrativa de Polanski embora seu talento jamais permita que o filme se torne vulgar, pedante, verborrágico ou redundante.
Ao fim, quando a relação entre o jovem e o arrogante Andrzej se mostra insustentável, o preço que Polanski cobra dele por sua demonstração truculenta de presunção é que Krystyna tem um breve interlúdio sexual com o rapaz, quando Andrzej se afasta.
Ela se despede então do jovem e reencontra, mais tarde, seu parceiro. Ambos parecem frustrados já que a presença do jovem em nada acrescentou à chama de seu relacionamento que se extinguia. E assim eles permanecem, ao irem embora, dentro de seu carro, no mesmo enquadramento que iniciou o filme.
A experiência deu errado.
Mas, o filme de Polanski, este sim, dá muito certo!

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