sexta-feira, 23 de junho de 2017

Estrelas Além do Tempo

O grande problema deste filme genuinamente simpático é a expectativa que o fato de ter ele sido indicado ao Oscar de Melhor Filme pode gerar: O público tende a esperar dele uma excelência e acabamento artístico que ele não tem.
Não é tão bom quanto “Histórias Cruzadas”, por exemplo (com o qual guarda imensas semelhanças), e certamente está longe de qualquer comparação com o magnífico “Os Eleitos”, cujos eventos narrados a trama desta produção aborda constantemente.
A grande verdade é que “Estrelas Além do Tempo” teve seu lugar entre os oito indicados ao Oscar 2017 devido a uma questão de cota: Foi a resposta não muito válida da Academia para a polêmica do “OscarSoWhite” ocorrida um ano antes –dessa forma, este filme singelo e descompromissado, que poderia surpreender o público, acabou alçado à um nível que sua simplicidade é incapaz de igualar. E isso pode estragar a experiência de vê-lo.
E ver “Estrelas Além do Tempo” é um bocado necessário.
Ele conta a história pouco conhecida de três mulheres negras de inteligência prodigiosa, Katherine Goble (Taraji P. Henson, charmosíssima), Dorothy Vaughan (Octavia Spencer, de “Histórias Cruzadas”) e Mary Jackson (Janelle Monáe), que tiveram o infortúnio de viver na segregada Flórida, nos EUA dos anos 1960. Hábeis com números, elas foram recrutadas para trabalhar na NASA, em meio ao auge da Corrida Espacial Norte-Americana contra os russos.
Cada um das três amigas viveu seus revezes separadamente: Katherine foi nomeada consultora do chefe de operações Al Harrison (Kevin Costner) e, embora fosse melhor e mais capaz que a maioria de sua equipe, era obrigada não só a tomar café separadamente, como também tinha que caminhar 800 metros até o banheiro para negros mais próximo toda vez que precisava usá-lo (!); Dorothy tentou uma vaga como supervisora por meses –função que ela já vinha ocupando, tendo a supervisora oficial adoecido –o que lhe era negado paulatinamente por sua superiora, a amargurada Srta. Michaels (Kirsten Dunst). Sua saída: Com a chegada dos imensos computadores da IBM, ela roubou um livro da biblioteca pública (!) e especializou-se por conta própria em linguagem Fortran, tornando-se imprescindível; já, Mary lutou para tornar-se engenheira-chefe no departamento de construção de protótipos –e precisou obter uma autorização na Justiça para conseguir assistir aulas avançadas cujos cursos segregados eram, segundo a lei da Virgínia, exclusivos aos brancos.
Debruçadas, como todos os funcionários da NASA, ao pioneiro Programa Mercury, elas são mostradas em sua fundamental colaboração para com o inédito vôo orbital do astronauta John Glenn ao redor da Terra, evento que ocupa a maior parte da narrativa.
Uma história tremendamente edificante –e desta maneira tratada pela direção de Theodore Melfi que por vezes se deixa descontrolar pelo momento: Ele exagera na caracterização dos brancos opressores, pesa o ritmo em cenas que precisavam ser enxutas e perde um tempo precioso com detalhes banais. Sua condução não é tão acertada quanto a de Tate Taylor no equilibradíssimo “Histórias Cruzadas”, cujo tema e a presença de Octavia Spencer levam imediatamente a uma comparação, mas o filme tem seus méritos: A trilha sonora assinada por Hans Zimmer e Pharrell Williams (também ele produtor) tem lá seus momentos e a reconstituição de época é caprichadíssima. No numeroso elenco, além das excelentes Taraji P. Henson e Octavia Spencer, brilha também o magnífico Mahershala Ali (ele já havia feito par romântico com Taraji em “O Curioso Caso de Benjamin Button”), Janelle Monáe é a mais fraca das três protagonistas e, verdade seja dita, sua personagem ganha o arco narrativo mais mal trabalhado; os demais membros do elenco oscilam de forma maniqueísta entre o francamente apático (Kirsten Dunst, Sarah Palson, Jim Parsons, de “Big Bang Theory”) e o meramente displicente (Kevin Costner), a única exceção é a breve participação de Glen Powell (de “Jovens, Loucos e MaisRebeldes”) como John Glenn.
A despeito de suas limitações artísticas, “Estrelas Além do Tempo” é ainda assim um filme pertinente e essencial ao cumprir com louvor a tarefa de enfim jogar um pouco de luz sobre essas três mulheres cuja contribuição para a história norte-americana foi inestimável apesar de todos os obstáculos e injustiças que vieram a enfrentar.

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