As adaptações para cinema de obras de Stephen
King ainda não haviam virado moda quando Brian De Palma, nos anos 1970, decidiu
transformar o livro “Carrie” em filme.
De Palma enxergou, na trama protagonizada por Carrie
White (a magrela Sissy Spacek, vibrante e perfeita no papel), um invólucro
perfeito para expressar suas características narrativas –que começavam a se
consolidar junto ao público e crítica –num gênero ligeiramente distinto dos
filmes de suspense em homenagem à Hitchcock que vinha fazendo: O terror
explícito.
De Palma compreendeu que a caracterização da
realidade (ou a falta dela, conforme o filme) consistia de um efeito diferente
no público conforme o gênero por meio do qual uma determinada trama era
abordada. Afoito a caracterizações expressivas e extravagantes, ele sabia que o
melhor meio de conceber uma obra assustadora sobre os percalços
desestabilizadores da juventude (e capaz de alcançar as impressões exigentes
dessa mesma juventude) seria através de uma parábola de terror; e dentre os
escritores, King era dos poucos que manipulava com habilidade textos que
mesclavam medo sobrenatural e minúcia sentimental.
Não há, portanto (e nem precisa haver)
sutileza, na forma como De Palma mostra que a desajeitada e tímida Carrie é
perseguida no colégio onde é desprezada por meninos e meninas. Sua primeira
cena já é de um exemplo audaz: A câmera passeia de modo quase lírico pelo
banheiro feminino (e De Palma não se furta a flagrar algumas adolescentes
nuas!) para terminar em Carrie que, durante o banho, tem sua primeira
menstruação. Sem qualquer informação a respeito, a reação da jovem ao sangue é
de pânico. E a de suas amigas, de crueldade: Elas menosprezam e riem do pavor
dela.
São as fases comuns da adolescência, portanto,
transfiguradas pelo talento de Brian De Palma e Stephen King, num instante do
mais puro medo: Aquilo que de absolutamente pior poderia ocorrer numa situação.
Em sua casa, a rotina de Carrie se releva ainda
pior: Sua mãe fanática (Piper Laurie) deixa a menina a beira de um constante
ataque de nervos com suas recriminações de cunho excessivamente religioso. Além
disso, os colegas de escola de Carrie (entre eles, um John Travolta em início
de carreira) planejam novas maldades, entre as quais a mais ambiciosa é uma
pegadinha terrível realizada no vindouro baile de formatura.
O quê ninguém sabe é que Carrie, aos poucos,
desenvolve poderes paranormais cada vez mais perigosos que, somados à
indignação das injustiças que acaba sofrendo, culminam em um verdadeiro banho
de sangue justamente na noite de formatura.
Não obstante o sucesso que
alcançou, bem como a forma inestimável com que marcou a cultura pop (a ponto de
ganhar uma continuação prosaica e falha em 1999, uma infinidade de imitações e
até uma ridícula e desnecessária refilmagem em 2013), o trabalho de adaptação
de Brian De Palma à época foi tão desigual, estilizado e requintado que os
livros de King, ainda assim, levariam quase uma década para serem absorvidos
pela máquina hollywoodiana.
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