terça-feira, 6 de março de 2018

Esposamante

Sublime este trabalho fabuloso do diretor Ettore Scola, daqueles que não encontrariam uma categoria à qual se encaixar nos dias de hoje –e, por isso mesmo, jamais seriam realizados.
Um clássico do cinema erótico italiano que paradoxalmente tem tanto a dizer quanto tem a mostrar –talvez, até mais!
Laura Antonelli (grande razão para se ver o filme) é Antonia, casada com Luigi (Marcelo Mastroianni) e por ele mantida numa certa inércia. Para Luigi é deveras conveniente que a esposa se mantenha ignorante: Adúltero, escorregadio, não raro falastrão e ostensivo, Luigi só é tolerável em seu comportamento incorrigível pelo pouco que a mulher tem ciência dele. Tudo isso, lógico, muda.
Luigi é obrigado a refugiar-se num terraço de propriedade de um amigo a fim de escapar das conseqüências acarretadas por suas opiniões políticas inflamadas.
Desse terraço (que fica bem em frente à sua casa) Luigi testemunha todas as fases pelas quais Antonia irá passar a partir de seu sumiço: O desespero e a perplexidade que se seguem naturais ao seu desaparecimento; as tentativas iniciais –e normalmente hesitantes –em assumir por conta própria os negócios do marido; a inesperada revelação de seu tino empresarial e sua desenvoltura para negociações; e, por fim, a descoberta da própria sexualidade antes reprimida que se expressa então em passagens notáveis (para a época inclusive) onde Antonia experimenta diversos parceiros sexuais e conhece novas práticas que sequer era capaz de conceber.
O registro desse desabrochar se dá por meio de uma atuação bastante austera da parte da belíssima Laura Antoneli, enquanto que Luigi, na atuação melindrosa, cafajeste e sôfrega de Mastroianni, assiste toda essa metamorfose numa espécie de “camarote forçado”, o quê proporciona uma insuspeita sensação de catarse.
Bons tempos em que o cinema europeu proporcionava notáveis pérolas como esta, impregnadas de malícia e humanismo.

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