terça-feira, 6 de março de 2018

Susie e Os Baker Boys

Existem algumas presenças que engrandecem um filme, que o removem da mediocridade e o tornam relevantes, dignos de atenção e de apreciação.
Esse é o caso de “Susie e Os Baker Boys”. Ele até teve quatro indicações ao Oscar –entre as quais de Melhor Fotografia para o habilidoso Michael Balhaus –mas, o dado realmente significativo dele, e que o torna o grande filme que é se chama Michelle Pfeifer.
Daquelas atrizes raras que unem beleza acachapante e um talento capaz e real, ela ostenta aqui outra coisa talvez ainda mais inapreensível: Uma espécie de magnetismo que parece atrair para si e para sua personagem não somente o olhar da câmera, mas também o interesse do expectador.
Podem chamar de carisma, podem chamar de fotogenia ou de sex-appeal, mas seja o que for, poucas ostentaram em um filme de forma tal ofuscante e arrebatadora quanto ela.
Na narrativa do diretor Steve Kloves (roteirista de “Garotos Incríveis” e “Harry Potter e A Pedra Filosofal”), esse banquete para os olhos não é servido de imediato ao expectador: Ele se demora em outros coadjuvantes que, de uma certa maneira, são também os protagonistas reais do filme, os Baker Boys.
Uma dupla de irmãos pianistas composta por Jack e Frank Baker (Jeff e Beau Bridges, irmãos na vida real), os chamados Baker Boys enfrentam uma fase de vacas magras comum na profissão de artista que vive noite após noite, de apresentação em apresentação. Seu repertório musical já não interessa mais tanto aos clubes noturnos de Seattle. As chamadas para shows se reduzem. Eles precisam diversificar.
Afável, Frank sabe que contratar uma cantora pode ampliar suas chances de lucrar, tornando seu show mais variado –e como pai de família, ele também se mostra mais alarmado com o baixo rendimento do ofício. Jack, porém, não gosta da idéia, taciturno, arredio e artisticamente acomodado, ele não se satisfaz com a possibilidade de alguém desconhecido entrar e interferir na dinâmica profissional e pessoal que ele mantinha com o irmão (a qual, aos trancos e barrancos, eles até que levavam bem).
Os testes sucessivos para as candidatas que se apresentam são frustrantes.
Até que surge a personagem que cataliza todas as atenções do filme: A ex-call girl Susie Diamond que, do início ao fim da produção, Michelle Pfeifer interpreta com fulgor genuíno e irreprimível.
Como cantora, Susie é talentosa (ainda que espalhafatosa), e como mulher, ela é deslumbrante (ainda que desbocada e visivelmente selvagem).
Agora um trio, eles obtém uma sobrevida profissional que antes não tinham atuando separados. A relação entre Susie e Frank é constantemente fraterna, oscilando entre implicância, camaradagem e indiferença.
Com Jack a situação é outra. Há uma nítida atração, ainda que ambos saibam que envolver-se num momento em que a parceria profissional está dando certo não seja uma boa idéia.
Isso acontece numa ocasião em que Frank tem de se ausentar, deixando Jack e Susie sozinhos para se apresentar em uma excursão num hotel de luxo –e a cena de Michelle Pfeifer cantando deitada no piano é uma imagem de uma sensualidade e de uma sedução que chega a ser assombrosa!
A condução do diretor Kloves –aqui estreando no ofício –não encontra oportunidades para expressar alguma personalidade mais forte ou um estilo mais marcante, no entanto, ele tem bom senso o suficiente para deixar que seus ótimos personagens assumam inteiramente o cerne da narrativa a despeito do enredo banal e previsível que os norteia; pois sabemos desde o início os desdobramentos que surgirão na relação entre Susie e Jack, e que eles irão esbarrar na própria relação entre Jack e seu irmão e até mesmo na questão pertinente do quão explorado e exploratório é o uso do artista por sua arte.
A narrativa de Kloves passeia por esses tópicos com a leveza de um filme de aventura, deixando de se aprofundar em questões que poderiam fazer dele um grande filme. Se ao fim ainda resta algo que o torne uma obra memorável, certamente é Michelle Pfeifer e sua composição devastadora, a um só tempo sexy, empática e polivalente (é ela mesma quem canta as músicas do filme), a grande e verdadeira estrela deste filme satisfatório sobre os tortuosos caminhos da vida e da arte.

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