Uma agência bancária. Um grupo de criminosos
motivados. Um seqüestro. Com esses elementos paradigmáticos ao gênero policial,
o diretor Sidney Lumet concebeu um dos mais raivosos e pertinentes panoramas
das ideologias americanas dos anos 1970, pelo prisma de um gênero
cinematográfico que ganhava, naquele período, sucessivas reformulações.
É um dia quase bucólico no bairro do Brooklyn,
em Nova York, quando um grupo notadamente amador invade uma agência a fim de
fazer seus funcionários de reféns. Alguns não têm muita certeza de sua
participação no crime –um deles até mesmo desiste logo no início!
Mas, não Sonny (Al Pacino).
Logo, um cerco se forma em torno do lugar e o
filme de Lumet deixa bem claro que irá exaurir os nervos do expectador nas
tensas horas que se seguirão.
Uma multidão se aglomera do lado de fora da
agência sitiada pela polícia e, conforme o tempo vai passando, começam
ironicamente a compactuar com as atitudes prosaicas e de ordem proletária dos
seqüestradores –o povo amargurado pelos contratempos civis de então se
identifica mais com os bandidos do que com a polícia (o massacre da
penitenciária de Attica, por exemplo, é até mencionado em dado momento).
À medida que a situação caminha para a
necessidade de um desenlace, algumas coisas vão ficando claras para os homens
da lei e para o expectador: Sonny é homossexual e sua presença naquele crime é
tão somente um meio de obter dinheiro para que possa pagar uma cirurgia de
mudança de sexo ao seu parceiro (vivido por Chris Sarandon).
A polícia percebe também outra coisa: Na
articulação e na proeminência verbal demonstrada por Sonny desde o começo, eles
deixaram de notar aquele que era o integrante mais perigoso do grupo –o calado,
frio e potencialmente implacável Sal, vivido por John Cazale (num personagem
sombrio completamente diferente dos tipos que ele viveu em “O Poderoso Chefão”
e “O Franco Atirador”).
“Um Dia de Cão” segue assim febril, intenso e
asfixiante na direção de um desfecho onde o roteiro e a direção de Sidney Lumet
contrapõe a expectativa de um final apoteótico com um encerramento abrupto,
capaz de deixar o expectador tão desconcertado quanto o protagonista –no
processo de humanizar seus personagens, Lumet não deixa de salientar que há um
preço muito caro para todas as intransigências do ser humano, inclusive, a de
querer ser e ter mais do que se tem e do que se é.
Em sua já clássica
estrutura, o filme é quase um teatro filmado –no fulgor insuspeito das
atuações, na confinação óbvia de um único cenário durante grande parte da
duração –mas, é também extraordinariamente cinematográfico: Tão marcante e
essencial é “Um Dia de Cão” para o estilo de filme que abraça que mesmo os
sucessos de hoje ocasionalmente lhe são obrigados a pagar certo tributo –e a
referência recente mais forte que vem à memória é o início antológico de
“Batman-O Cavaleiro das Trevas”, onde o diretor Christopher Nolan (um grande
entusiasta dos filmes policias dos anos 1970) dedica os primeiros quinze
minutos de seu filme a praticamente reverenciar este trabalho de Lumet.
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