Já na primeira cena de “A Força do Amor”, de
1983 –a até que notável refilmagem do “Acossado”, de Godard –o diretor Jim
McBride já deixava bem clara, numa forte referência, sua apreciação pelo
trabalho do incompreendido músico Jerry Lee Lewis; de quebra, McBride também
deu uma dica (proposital ou não) de um de seus futuros projetos: A biografia
transfigurada por liberdade poéticas do próprio Lewis, “A Fera do Rock”, de
1989 –no original, “Great Balls Of Fire!”, um de seus grandes sucessos.
Jerry Lee Lewis, de fato, reunia uma série de
características que o irrequieto diretor Jim McBride tanto aprecia num
protagonista: Uma petulância saudável e uma constate atmosfera de desafio e
atrevimento à sua volta –todos predicados aos quais a alucinada interpretação
de Dennis Quaid faz jus.
Vindo de uma família tradicionalmente religiosa
(o pastor Jimmy Swaggart, vivido por Alec Baldwin, era seu primo), Lewis
almejou ascender na música por caminhos tortuosos: Enveredou pelo gênero
musical do momento, o rock’n roll, tocando não guitarras ou violões tal qual
ídolos habituais (como Elvis Presley, de quem foi rival assumido), mas
dedilhando de forma selvagem as teclas de seu piano.
Todavia, o que escandalizou o mundo não foi
isso; foi, na verdade, seu casamento –o terceiro de Lewis –com a própria prima
(Winona Ryder), de catorze anos, bem quando estava prestes a atingir o auge de
seu estrelato, amargando, em vez disso, o ostracismo.
Empregando o mesmo vigor e ritmo com os quais
desbravou outros gêneros, McBride criou um musical pulsante e palpitante cuja
euforia contaginate da narrativa reflete magnificamente bem o estado de
espírito constantemente pirado de seu personagem principal.
Dito isto, é sintomática a falta de compromisso
de seu trabalho para com um realismo imparcial e sério: Seu filme ironiza os
detalhes folhetinescos de sua trajetória, as relações (e reações) exacerbadas
quanto à percepção da fama, e observa (não destituído de uma pontinha de
cumplicidade) o oportunismo com o qual Lewis torcia as noções morais a seu
favor –outra característica constante nos protagonistas de McBride –nunca
deixando de lado um perene senso de humor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário