sexta-feira, 8 de junho de 2018

A Fera do Rock


Já na primeira cena de “A Força do Amor”, de 1983 –a até que notável refilmagem do “Acossado”, de Godard –o diretor Jim McBride já deixava bem clara, numa forte referência, sua apreciação pelo trabalho do incompreendido músico Jerry Lee Lewis; de quebra, McBride também deu uma dica (proposital ou não) de um de seus futuros projetos: A biografia transfigurada por liberdade poéticas do próprio Lewis, “A Fera do Rock”, de 1989 –no original, “Great Balls Of Fire!”, um de seus grandes sucessos.
Jerry Lee Lewis, de fato, reunia uma série de características que o irrequieto diretor Jim McBride tanto aprecia num protagonista: Uma petulância saudável e uma constate atmosfera de desafio e atrevimento à sua volta –todos predicados aos quais a alucinada interpretação de Dennis Quaid faz jus.
Vindo de uma família tradicionalmente religiosa (o pastor Jimmy Swaggart, vivido por Alec Baldwin, era seu primo), Lewis almejou ascender na música por caminhos tortuosos: Enveredou pelo gênero musical do momento, o rock’n roll, tocando não guitarras ou violões tal qual ídolos habituais (como Elvis Presley, de quem foi rival assumido), mas dedilhando de forma selvagem as teclas de seu piano.
Todavia, o que escandalizou o mundo não foi isso; foi, na verdade, seu casamento –o terceiro de Lewis –com a própria prima (Winona Ryder), de catorze anos, bem quando estava prestes a atingir o auge de seu estrelato, amargando, em vez disso, o ostracismo.
Empregando o mesmo vigor e ritmo com os quais desbravou outros gêneros, McBride criou um musical pulsante e palpitante cuja euforia contaginate da narrativa reflete magnificamente bem o estado de espírito constantemente pirado de seu personagem principal.
Dito isto, é sintomática a falta de compromisso de seu trabalho para com um realismo imparcial e sério: Seu filme ironiza os detalhes folhetinescos de sua trajetória, as relações (e reações) exacerbadas quanto à percepção da fama, e observa (não destituído de uma pontinha de cumplicidade) o oportunismo com o qual Lewis torcia as noções morais a seu favor –outra característica constante nos protagonistas de McBride –nunca deixando de lado um perene senso de humor.

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