sábado, 1 de abril de 2023

O Menino, A Toupeira, A Raposa e O Cavalo


 O grande vencedor do Oscar 2023 de Melhor Curta-Metragem de Animação é de uma delicadeza sem fim. Ele conta a história de uma criança, um garotinho (na voz de Jude Coward Nicoll) que surge numa planície tomada pela neve. Ele não tem casa e esse é o desejo que habita seu coração, como ele bem relata a uma pequena toupeira (voz de Tom Hollander) que logo aparece (os personagens do filme podem, todos, conversar entre si). Unidos em sua solidão, os dois dividem impressões abstratas e se tornam amigos.

Aos poucos, um terceiro indivíduo surge para rondá-los, é a Raposa (voz de Idris Elba), arredia, desconfiada, beligerante, no entanto, ao ficar presa numa armadilha, ela descobre que a Toupeira e o Menino são seus amigos e estão ali para ajudá-la. Ela passa a segui-los, incapaz de expressar seus bons sentimentos com tanta espontaneidade quanto os outros, embora tais sentimentos estejam lá –na concepção generosa, esperançosa e carregada de espirituosidade dos realizadores, nenhum ser da Criação é maldoso em sua essência.

Em sua peregrinação pela floresta do mundo, os três terminam encontrando o Cavalo (voz de Gabriel Byrne) a contribuir com sua altivez para o núcleo familiar que muito aos poucos eles parecem compor. O Cavalo, contudo, guarda uma grande e maravilhosa surpresa.

Dirigido por Charlie Mackesy e Peter Baynton, o curta traz algumas mensagens morais de grande simplicidade e expostas com incontornável transparência no arquétipo imediatamente relacionável de seus quatro protagonistas –e disso, tira toda sua força. Na dinâmica que constroem, os personagens expoem diferentes vulnerabilidades, todas acalentadas com gentileza e empatia pelos demais. O Menino é carente e quer morar em uma casa, mas, entre os amigos que descobriu nenhuma concepção de lar haverá de ser mais poderosa que a presença deles; a Toupeira se vê pequeno diante da vastidão do mundo à sua volta, mas, seus companheiros lhe deixam clara a diferença que ele faz; a Raposa é relutante, fechada e temerosa, mas compreende melhor que qualquer um a tenacidade para atravessar os revezes da vida e aguentar firme; e o Cavalo se sente só na inveja que teme despertar em seus pares, mas encontra nos outros três uma família que lhe oferece apoio e compreensão.

Feito de inesgotável amor incondicional, o filme de Mackesy e Baynton faz muito lembrar as lições preciosas deixadas pelo escritor Antoine de Saint-Exupéry em sua obra-prima literária “O Pequeno Príncipe” (e é baseado, também ele, num livro, lançado em 2019, pelo próprio Mackesy), contando, inclusive, com um fenomenal e característico aparato visual que transforma cada frame animado em um quadro de encanto sem igual, nesta obra de imensa qualidade, grandeza e humanismo.

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