Com a consolidação de sua grande carreira,
Martin Scorsese se viu cada vez mais na confortável posição de poder realizar
os grandes filmes que sempre fez, ao mesmo tempo em que prestava homenagem a
seus ídolos, realizadores que hoje, aos olhos de uma platéia mais jovem e menos
afoita a esmiuçar um passado longínquo que lhes é desinteressante, correm o
sério e injusto risco de serem esquecidos.
É o caso de, entre outros, o grande Jacques
Tourneau, um dos artesãos que ganha uma apaixonada referência neste “Ilha do
Medo”, quarta colaboração de Martin Scorsese com o astro Leonardo Dicaprio (as
outras três foram “Gangs de Nova York”, “O Aviador” e “Os Infiltrados”, e ainda
haveria uma quinta, “O Lobo de Wall Street”) e uma de suas poucas incursões no
gênero de terror (outra seria “O Cabo do Medo”), por meio do qual ele resgata
uma narrativa preocupada com sugestão e caracterização –elementos em baixa no
descerebrado cinema realizado e consumido hoje.
É 1954. Dois agentes federais (interpretados
por Dicaprio e Mark Ruffalo) chegam à soturna Shutter Island, manicômio isolado
numa ilha remota, famoso por reunir técnicas inovadoras para tratar doentes
mentais, e também, por trazer entre seus pacientes criminosos de altíssima
periculosidade.
Um mistério paira no ar.
Segundo seu ladino e
ligeiramente afetado diretor-chefe (Ben Kingsley, numa atuação cheia de
engenhosidade e sentido), uma das pacientes desapareceu de seu quarto,
simplesmente como se tivesse evaporado, a despeito da extrema segurança do
lugar. Durante sua investigação, os agentes frustram-se ao bater de frente com
imposições de protocolo, e com uma estranha apatia de todos a sua volta.O final, de uma manobra roteirística que soa francamente imprevisível, reitera uma questão subjacente em outro filme estrelado por Leonardo Dicaprio, "A Origem", de Christopher Nolan, no qual, assim como aqui, as diferentes pressuposições de realidade pesam de modo irreversível nas escolhas finais de seus personagens.
A impecável direção de Martin Scorsese deposita muita de sua confiança nas reviravoltas constantes da trama, que reúne psicanálise, traumas de guerra, e elementos sobrenaturais, e se vale de pontas pra lá de significativas de Jackie Earl Haley e Patricia Clarkson.
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