Os mais distintos personagens e personalidades já povoaram as obras de cinema desde que a sétima arte foi concebida e adquiriu seu status de entretenimento popular. Drácula. Sherlock Holmes. Jesus Cristo. Entre eles, certamente está também o galante fora-da-lei que vive para atazanar a vida do xerife de Nothingham e maneja arco e flecha como ninguém.
As diferentes personificações de suas aventuras vão do humor assumido à mais comercial das aventuras, da descontração ao compromisso sério e respeitoso com a lenda, passando por reinvenções que visitam os mais diferentes gêneros e propostas.
Aqui, alguns deles:As Aventuras de Robin Hood (1938)
Inicialmente dirigido por Willian Keighley, mas
depois substituído por Michael Curtiz (de “Casablanca”) sob pretexto de que as
cenas de ação, sem um realizador experiente, careciam de brilho, este clássico
do capa & espada conta a história do fora-da-lei Robin de Locsley (um
vistoso e fotogênico Errol Flynn, por muito tempo o grande astro desse gênero)
que, escondido na floresta de Sherwood, roubava dos ricos para dar aos pobres
desafiando assim o xerife de Nothingham, e ajudando os oprimidos camponeses,
durante um período de opressão em que o perverso Rei João substituiu Ricardo
Coração de Leão quando este havia partido para lutar nas Cruzadas em Jerusalém.
O conto de Walter Scott ganha aquela que, na
opinião de muitos puristas, é sua versão definitiva, ganhadora do Oscar de
Melhor Trilha Sonora.
Robin
Hood-O Invencível (1960)
Longe de seu habitat natural –os filmes de
terror dos estúdios Hammer –o diretor Terence Fisher trouxe a tiracolo um de
seus astros recorrentes (Peter Cushing), e fez uma versão muita particular da
lenda, concebendo uma trama que desvia-se dos acontecimentos mais conhecidos
que cercam os personagens.
Nesta produção curiosa, Robin é interpretado
com uma ponta de astúcia e ambigüidade –oriundas da formação artística do
diretor Fisher, certamente –por Richard Greene, e trás consigo uma Lady Marian
surpreendente num registro muito mais sensual do que pudico, personificada por
Sarah Branch.
Robin
Hood (1973)
Durante muito tempo tido como uma das
referências da clássica história, o desenho da Disney –no qual Robin Hood ganha
as formas e expressões ladinas de uma raposa –pode até frustrar quem espera por
uma animação no patamar de qualidade do estúdio: A Disney enfrentava na época
um período de reestruturação interna que prejudicou bastante o resultado final.
Robin Hood é um fora-da-lei que vive a
perturbar as autoridades de Nothingham, sobretudo seu xerife, em função de sua
luta para "roubar os ricos e dar aos pobres". Seu charme ousado e
galante conquista inclusive o coração de Lady Marion, e a ira do Rei João.
Lembrado sempre como um dos mais insatisfatórios desenhos da Disney, provavelmente
por ter sido produzido num período em que os estúdios passavam por uma
transformação profissional, logística e conceitual, é de fato, equivocado, na
decisão de transformar a história de Robin Hood num emaranhado de cenas cômicas
e dispersas que não dão unidade alguma à história e, sobretudo, ao colocar
animais interpretando personagens humanos.
Robin
Hood-O Trapalhão da Floresta (1974)
Pouco depois à animação da Disney, foi a vez
dos Trapalhões lançarem a sua própria versão da lenda. No entanto, os Trapalhões,
como eles passaram a ser conhecidos, não haviam sido formados ainda naquele ano
de 1974 –os integrantes que vemos aqui se resumem a Didi (Renato Aragão, que
neste filme leva o nome de Zé Grilo) e Dedé Santana (chamado aqui de Willian),
e próprio humor feito por eles aqui não é tão inofensivo e dirigido às crianças
como, aos poucos passou a ser feito, mas a história, em sua tentativa algo
satírica de transpor a lenda de Robin Hood para o contexto brasileiro
–inclusive com um sutil subtexto a falar sobre os latifundiários e sua opressão
ao proletariado –revela-se tão notável quanto curiosa, responsabilidade
certamente da condução do diretor J.B. Tanko, realizador dos melhores filmes
dos Trapalhões.
Na trama, Rei João é João Climério e Ricardo
Coração de Leão é seu meio-irmão Ricardo que vai fazer um safári na África (!),
deixando sua fazenda à mercê dos ditames tirânicos do vilão.
O grupo de foras-da-lei é, assim, um bando de
aldeões que resolve perturbar o fazendeiro e seus capangas, lembrando um pouco
o movimento sem terra –ainda que muito de suas caracterizações pareçam remeter
à Revolta dos Farroupilhas.
Robin Hood (interpretado pelo galã Mário
Cardoso que também participou de “Os Saltimbancos Trapalhões”) sofre um
ferimento e, enquanto se recupera, é substituído em suas peripécias –no melhor
estilo “Kagemusha”, de Akira Kurosawa!! –pelo personagem de Renato Aragão que,
como sempre, apronta poucas e boas.
Décadas mais tarde, em 1990, Renato Aragão e
seus companheiros (já compondo o grupo consagrado dos Trapalhões) voltaram a
trabalhar numa nova trama envolvendo o personagem em “O Mistério de Robin
Hood”, mas sem qualquer relação de história ou de essência com a lenda clássica
–sem falar que era uma porcaria!
Robin
& Marian (1976)
Eis que o diretor Richard Lester –normalmente
um operário padrão dos estúdios tendo entregado ao longo da carreira inúmeras
obras de encomenda, ainda que de qualidade, como “A Vingança de Milady”,
“Viagem Fantástica” e até mesmo “Superman 3” –realiza um de seus melhores trabalhos.
Sua visão sobre a lenda ousa imaginar Robin
Hood e sua trupe de coadjuvantes, não no início, como normalmente o cinema faz,
enaltecendo a juventude, mas no seu apogeu.
Quando a história começa, já contam duas
décadas dos famosos feitos de Robin, agora tornado um valoroso guerreiro de
confiança de Ricardo Coração de Leão –e, por conta de qual mérito, todo esse
tempo transcorrido, ele passou lutando nas Cruzadas (o quê a história contada
fez parecer ser uma obsessão para Coração de Leão).
Com a morte do Rei Ricardo, Robin regressa para
a Inglaterra almejando enfim uma vida de paz, mas as intrigas de seus
arquiinimigos, o Xerife de Nothingham e o Rei João, não cessaram, e ele se vê
obrigado a reunir o antigo bando de foras-da-lei em Sherwood, bem como retomar
a relação com Lady Marian, que ficou todo esse tempo em um convento.
Veteranos de talento a toda à prova surgem
assim interpretando os personagens já num momento crepuscular como Sean Connery
(Robin Hood), Audrey Hepburn (Lady Marian), Nicol Willianson (Pequeno John),
Ronnie Barker (Frei Tuck), Robert Shaw (o xerife de Nothinghan), Ian Holm (Rei
João) e Richard Harris (Ricardo Coração de Leão), contribuindo para fazer desta
uma das mais desiguais e primorosas versões do conto de Walter Scott.
Robin
Hood-O Príncipe dos Ladrões (1991)
Talvez o mais famoso dentre todos os filmes,
muito por conta do enorme prestígio junto ao público que o astro Kevin Costner
(recém-saído do oscarizado “Dança Com Lobos”) gozava à época. Ele e o diretor
Kevin Reynolds tiveram uma longa e oscilante colaboração ao longo dos anos
entregando trabalhos como o juvenil e divertido “Fandango”, o catastrófico
“Waterworld-O Segredo das Águas” e a aclamada minissérie “Hatfields &
McCoys”.
A trama vivenciada por Robin Hood aqui já era
um indicativo das reinvenções nem sempre inspiradas que histórias clássicas
como esta viriam a sofrer no futuro, nas mãos de produtores de Hollywood.
Neste filme, por exemplo, Robin Hood encontra
os foras-da-lei de Sherwood já como um bando completo –nas outras versões, é o
próprio Robin quem monta o grupo –o romance com Lady Marian (Mary Elizabeth
Mastrantonio, uma das jovens atrizes em alta na época) tem elementos modernos
de implicância, relutância e sensualidade; o vilão (Alan Rickman, divertido e
caricato) não poderia ser mais pueril; o personagem inédito de Morgan Freeman
(um mouro), de suma importância à trama, foi introduzido como forma de ilustrar
esse objetivo de reinvenção (além de antecipar um processo de
representatividade que hoje é via de regra entre filmes de estúdio); e as cenas
com arco e flecha são turbinadas por efeitos visuais que especulam
enquadramentos antes impossíveis.
Curiosidade: Sean Connery aparece aqui (numa ponta ao final) como Ricardo Coração de Leão, pelo que, à época, foi um cachê recorde por uma participação tão pequena.
Robin
Hood-O Herói dos Ladrões (1991)
Este filme muito mais obscuro, além de ter a má
sorte de ser lançado no mesmo ano do retumbante sucesso estrelado por Kevin
Costner, também era prejudicado pelo fato de trazer uma série de escolhas
equivocadas, a começar pela presença de Patrick Bergin como o Robin Hood mais
desprovido de carisma da história (seu filme mais famoso é “Dormindo Com O
Inimigo” onde ele faz o marido violento de Julia Roberts, e ele de fato serve
mais para fazer vilões mesmo...).
Como se não bastasse, o diretor John Irvin se
mostra pouco empolgado nas cenas de ação que quando não se desenrolam de
maneira formulaica e mecânica apresentam uma sucessão de incoerências. Se há
algum detalhe digno realmente de nota é uma jovem e sensual Uma Thurman
interpretando uma Lady Marian carregada de presença e magnetismo.
A
Louca! Louca História de Robin Hood (1993)
Inevitavelmente uma paródia. Entretanto,
assinada por um dos grandes comediantes americanos dos anos 1970 e 80, o
veterano Mel Brooks, mas que já mostrava sinais de cansaço nos anos 1990.
O galã Cary Elwes (de “Tempo de Glória” e que
fez algum sucesso como uma versão moderna de Errol Flynn na fantasia “A
Princesa Prometida”) é o Robin Hood nesta reencenação cômica e musical (!) da
lenda –certamente, pegando carona do imenso êxito da produção com Kevin
Costner, lançada anos antes –onde pouco se consegue achar de relevância: Mesmo
as piadas parecem não ter maiores propósitos junto à narrativa, o quê é no
mínimo frustrante quando se pensa que este é um filme do cara que fez “Banzé No
Oeste” ou “Primavera Para Hitler”.
Para se ter uma idéia, este Robin Hood cômico é
tão insípido que fica a dever (e muito!) à versão debochada e maliciosa do
personagem que aparece, por brevíssimos minutos, na animação “Shrek”, de 2001.
Robin
Hood (2009)
Já quase no fim da década de 2000, o diretor
Ridley Scott e o astro Russell Crowe, vindos de uma longa e produtiva parceria
(mas, cujo maior êxito foi indiscutivelmente “Gladiador”) resolveram revisitar
a lenda a fim de conceber um projeto que, em suas tintas épicas e em sua
ambientação medieval, resgatasse as mesmas características de seu grande
sucesso.
O resultado foi uma reinterpretação bastante
audaciosa da lenda que, além de tudo, almejava não apenas dar um inédito
subtexto de realismo histórico, mas que também nascia com um esqueleto de saga:
Este teria sido só o primeiro capítulo, firmando-se como uma espécie de
“origem” de Robin Hood e não uma versão moderna de suas famosas aventuras
–essas teriam vindo numa eventual continuação, se o filme tivesse feito sucesso
suficiente de público.
Não fez.
Durante a incursão do Rei Ricardo Coração de
Leão, da Inglaterra, em Jerusalém, no Século 12, um grupo de seus arqueiros,
liderados por Robin Longstride (Crowe, já um bocado velho para interpretar um
herói no princípio de sua jornada), abandona as trincheiras na França, para
retornar a sua terra natal. No caminho, Ricardo é morto, e os arqueiros se vêem
no meio de uma conspiração para minar a coroa inglesa, agora sob o comando do
irascível Rei João (Oscar Isaacs, muito mais jovem do que as versões
anteriores). Levado pelas circunstâncias, Robin assume a identidade do
cavaleiro morto, Robert Loxley, e assim apresenta-se no palácio real e, mais
tarde, ao pai e à esposa do verdadeiro Loxley, em Notthinghan, onde vai a fim
de devolver a espada do filho ao pai –neste filme, Lady Marian (interpretada pela
sempre eficiente Cate Blanchett) não é filha do Rei João, numa das inúmeras
licenças poéticas que se acotovelam no roteiro excessivamente rocambolesco e
cheio de desdobramentos de Brian Helgeland (co-roteirista de “Los
Angeles-Cidade Proibida”).
Mas o Rei João, em parte
influenciado pelo traiçoeiro Godfrey (Mark Strong), colocará toda a Inglaterra
ante uma invasão de tropas francesas, obrigando Robin a tornar-se líder de um
bando de foras-da-lei.
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