terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Cyrano de Bergerac

O cinema já havia realizado algumas adaptações da célebre peça em versos “Cyrano de Bergerac”, de Edmond de Rostand, incluindo o clássico “Cyrano”, de 1950, com José Ferrer, e até mesmo o simpático e despretensioso “Roxanne”, com Steve Martin e Daryl Hannah –uma versão norte-americana e bastante graciosa –mas, em 1990, o diretor francês Jean-Paul Rappeneau obteve aquela que deve ser a versão definitiva do romance com uma série de escolhas determinantes, como os valores hiperlativos de produção a que o cinema francês –já uma indústria –era capaz de obter (o filme levou o Oscar de Melhor Figurino), sendo que a maior e mais ostensiva delas é ter o francês Gerard Depardieu, um ator que muito provavelmente nasceu para tal papel: Narigudo, assim como o personagem (embora, também tenha usado uma prótese para aumentar ainda mais o tamanho do nariz), Depardieu ainda comparece com sua presença exuberante de cena, seu espalhafato dramático e seu vigor festivo, agregando ao personagem todas as características que ele de fato precisa –tão magistral é sua concepção que ele engole todos os demais atores e atrizes à sua volta.
Deveras, não é diferente com o próprio personagem: Figura proeminente na cidade onde serve como líder da guarda de espadachins, o também poeta Cyrano é admirado entre seus pares por sua bravura em combate e por sua verve passional nos embates verbais de qualquer natureza.
Mas, Cyrano se ressente do nariz gigantesco com o qual nasceu –e ai daquele que pronunciar qualquer gracinha a esse respeito!
Cyrano tem, portanto, a consciência do quão improvável é sua união com a mulher que ama, a doce Roxana (Anne Brochet). Mas, ela não ama ele, isso Cyrano sabe. O que ele ainda não sabe é que Roxana tem lá seu interesse no novo cadete, Christian (Vincent Pérez, que perde de lavada para o magnífico Depardieu), jovem e bonito –tudo aquilo que Cyrano não é.
Disposto a fazer ela ser feliz –mesmo que assumindo um papel secundário nesse processo –Cyrano se incumbe de preparar a corte para Roxana, inclusive elaborando poemas e juras de amor que arrebatam o coração de Roxana pela sensibilidade da autoria, mas que acabam reconhecidas por ela como sendo escritos por Christian. Comovida pelo amor expresso naquelas palavras, ela se apaixona por ele e o reverencia nos anos seguintes, ignorante do que fato de que é o apaixonado Cyrano, e não o seu eleito, quem é o real autor de declarações românticas de tal profundidade.
O expectador desavisado e que encarar esta obra esperando alguma galhofa e ironia, sobretudo, baseado no aspecto engraçado de seu narigudo protagonista, irá se surpreender com a dramaticidade contundente e a predisposição para o trágico que pontuam a narrativa especialmente em seu terço final.
Um filme romântico no sentido literário dado ao termo, “Cyrano de Bergerac” conduz seus personagens e o expectador através de algumas das mais dolorosas ironias acerca do amor.

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