Dentre as três colaborações entre o bom diretor
Joe Wright e a esforçada atriz Keira Knightley, “Orgulho e Preconceito” é o
mais apreciado; “Desejo e Reparação”, o mais contundente e “Anna Karenina”,
certamente, o mais ambicioso.
Isso porque não apenas Wright lança mão dos
recursos sempre mais vistosos proporcionados pela alta tecnologia e pela
extravagância do cinema atual para conceber uma adaptação ainda mais
visualmente arrebatadora do que outras que vieram antes (como o clássico
estrelado por Greta Garbo), mas ele também o faz por meio de um truque de
linguagem desafiador e arriscado.
Neste “Anna Karenina”, as paredes se
transmutam, os cenários adquirem modificações a medida que, em diversas trocas
de cena, observamos os figurantes entrarem no filme e mudarem o cenário –que
ocasionalmente é flagrado em seus aspectos artificiais.
Wright conta que optou por esse estilo a fim de
enfatizar a atmosfera de mudança que predominava no contexto histórico da
trama, a Rússia de 1874.
Lembra uma peça de teatro na qual a proposta
experimental é de que os meandros técnicos da encenação interfiram na própria
impressão do público –nem sempre funciona...
Bela como sempre e num meio termo entre a
apatia e a tentativa de soar dramaticamente relevante, Keira Knightley é Anna,
cujo casamento com Alexei (Jude Law, fugindo do habitual papel do conquistador
romântico), definido pela incompatibilidade dos arranjos convenientes, já não
tinha lá muito fulgor, mas desanda de uma vez quando ela decide se envolver com
o aristocrata Vronsky (Aaron Taylor-Johnson, de “Kick Ass”), um amante que lhe
oferece a palpitação com a qual um dia ela sonhou dentro de seu casamento.
Todavia, a sociedade rigorosa a qual pertence
cobrará de Anna um terrível preço por suas escolhas quando o segredo de sua
afeição extraconjugal for descoberto.
Anna é uma daquelas personagens-chave da
literatura que determina a tragédia de seu destino ao entregar-se à
inconseqüência das emoções. No filme, contudo, não é isso que ela termina
sendo: Wright observa os comportamentos com uma contenção maior e mais ambígua
do que normalmente o faz, e com isso, seus personagens parecem distanciados do
expectador por uma curiosa barreira de incredulidade –é deveras difícil crer
num amor incondicional entre ela e Vronsky, pois Taylor-Johnson deixa evidente
demais para o expectador sua displicência para que a própria protagonista, por
mais relapsa que seja (e é isso que a narrativa por vezes a faz parecer),
também não a note.
É uma armadilha comum em filmes que retratam
uma situação de adultério: Oferecer uma abordagem equivocada de personagens
antagônicos e, no processo, inverter o objetivo da mensagem. Embora também
apático, Alexei não ganha o repudio do público a ponto de fazê-lo torcer por
Anna. Isso tudo e as relações que se constroem entre os três protagonistas e o
restante dos personagens (interpretados por um elenco notável) padecem de uma
dificuldade encontrada na suspensão de crença justamente devido à escolha
estética do diretor. O tempo todo, o cenário que se converte em estúdio lembra
ao público o faz-de-conta da encenação ainda que ela seja feita com empenho e
beleza.
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