sábado, 21 de setembro de 2019

Ned Kelly

Dirigida em 1970 por Tony Richardson, de “As Aventuras de Tom Jones”, esta é uma versão do famoso fora-da-lei australiano –outras versões mais conhecidas são as dirigidas por Yahoo Serious (de, “O Jovem Einstein”), esta em versão satírica, em 1994, e a mais tradicional e biográfica realizada por Greg Jordan, com Heath Ledger, em 2003 –cuja trama inicia-se atrevida com um prólogo em preto & branco nomeado “O Fim” (!). Vemos, portanto, que o protagonista, encarcerado e em iminente enforcamento por seus delitos, não acaba nada bem. A seguir, o filme adquire cores quando o outro segmento –que responde por todo o restante do filme –se inicia, “O Começo”.
Eis que vemos então Ned Kelly, interpretado pelo astro musical Mick Jagger (cuja escolha gerou controvérsia), em retorno ao rancho da família após cumprir uma pena na prisão.
Sobretudo, o trabalho de direção de Richardson parece desdobrar-se para contornar o fato de que seu protagonista é o mais fraco ator em cena –algo razoável visto que Mick Jagger é uma grande presença não um grande intérprete –ele o centraliza como uma figura fixa, deixando que os demais membros do elenco perambulem em torno dele, ostentem suas peculiaridades, apresentem suas reações. A ele, aparentemente, cabe ser o objeto imutável que acarreta as transformações, ora o caos; a força da natureza.
É um recurso inteligente que, por seu emprego constante do início ao fim do filme, acaba enervando o expectador.
Sobretudo, porque Richardson opta por uma narrativa evocativa e idílica, permeada por canções de autoria de Shel Silverstein, interpretadas por Kris Kristoferson e Waylon Jennings –somente uma delas é executada no filme por Jagger.
O grande drama que Ned Kelly protagonizou se deve pela intolerância e intransigência de sua comunidade e suas autoridades na época –entre 1878 e 1880 –que recusaram-se a aceita-lo como um cidadão redimido após sua passagem na cadeia.
Tendo até mesmo sua mãe e suas irmãs hostilizadas pela comunidade, restou a Kelly fazer aquilo que dele já esperavam: Uniu-se a seu irmão mais novo e dois amigos e formou uma gangue que passou a assaltar bancos, matar policiais e desafiar o sistema que não aceitou-o, transformando-se assim numa figura lendária, o bandido mais procurado do país.
Particularmente antológica (ao menos, na teoria) é a batalha final, onde a gangue de Kelly, trajando armaduras de ferro improvisadas que lhes protegia contra os tiros leva consigo inúmeros policiais –uma pena que o filme não soube encontrar um meio de faze-la, de fato, antológica (na prática).
O trabalho de Richardson busca uma fusão entre o cinema inglês do período –em meio ao qual ele era uma das referências –e o experimentalismo peculiar, pleno de expedientes notáveis do cinema australiano da mesma época, entretanto, seu filme é definido mesmo pelos inúmeros contratempos que ocasionaram as filmagens realizadas em Braidwood, Austrália: Doenças que assolaram o elenco e a equipe técnica, acidentes que ameaçaram seus coadjuvantes e até seu protagonista, incêndios que comprometeram materiais da produção, e uma troca de atrizes cercada por circunstâncias trágicas –a irmã de Ned, vivida por Diane Craig, era para ser interpretada por Marianne Faithfull, então namorada de Jagger, que terminou afastada devido a uma overdose de soníferos no set de filmagens.
Esse amargo teor caótico está todo lá no filme, fazendo indeterminado seu ritmo, confusa sua atmosfera e, no fim das contas, enfadonho o seu andamento.

Nenhum comentário:

Postar um comentário