quinta-feira, 5 de setembro de 2019

Uma Noite Muito Louca

Hoje, Keanu Reeves é um veterano que goza de prestígio junto ao público e crítica graças a excelentes filmes comerciais no currículo e uma reputação de caráter impecável, mas houve um tempo, em algum momento dos anos 1980, que era um jovem ator muito promissor.
Foi na qualidade de promessa hollywoodiana que ele estrelou “The Night Before” –ou “Uma Noite de Loucuras”, ou "Uma Noite Muito Louca" nos parcos nichos nacionais em que ele foi conhecido –dirigido e roteirizado por Thom Eberhardt, com nítida e apaixonada inspiração no genial “Depois de Horas”, de Martin Scorsese.
Todavia, o próprio trabalho de Eberhadt converteu-se, ele próprio, numa inspiração, ainda que obscura: Não obstante as influências mais recentes e famosas (como “Cara, Cadê Meu Carro?” e “Despedida de Solteiro Em Las Vegas”), este filme –como será bastante evidente por sua premissa –é uma das referências incontornáveis para a trama de “Se Beber, Não Case”.
Keanu Reeves é Winston, jovem estudante que, como todos os protagonistas adolescentes, acidentais e desafortunados nos anos 1980, padece da mediocridade perante seus pares.
Entretanto, o problema imediatamente urgente de Winston não é esse: Ele acorda num beco sujo, e com as roupas em farrapos, sem maiores lembranças ou informações de como foi parar lá ou do que aconteceu no noite anterior.
Claro que pouco-a-pouco sua memória vai retornando e, de situação em situação, ele vai reconstruindo o quebra-cabeça de sua então nebulosa aventura –as características narrativas melhor empregadas por Eberhardt e que respondem pelo aspecto mais eficaz do filme, presente sobretudo na ótima primeira metade.
Winston, na verdade, experimentou o supra-sumo da boaventurança para um jovem prestes a formar-se no colegial (mais um elemento inerente ao cinema dos anos 1980) –ele conseguiu ir à festa de formatura com a garota mais disputada do colégio (Lori Loughlin, de “Admiradora Secreta”) graças a uma aposta perdida por ela para suas colegas; o castigo era aceitar o convite dele.
No entanto, as confusões e encrencas que se seguiram –e que são elucidadas por meio de ocorrências sugeridas a medida que o filme avança –o levaram a experimentar um pesadelo: Ele a leva, no carro esporte do pai, para o lado errado da cidade, num subúrbio cujas roupas de gala que vestem atrai o interesse dos moradores locais.
Não há como negar que Thom Eberhardt, se não foi nada original ao moldar deliberadamente um pastiche juvenil de “Depois de Horas”, ao menos, soube fazer a lição de casa e percebeu a conjunção de pequenas sacadas que integravam a estrutura narrativa que Scorsese montou –e, se não as recria com brilho, o faz com despretensão e euforia relativamente contagiante.
Como é normal em muitos casos, o filme perde vertiginosamente sua graça conforme os indícios até então incertos começam a serem revelados; e sem o charme de seu mistério para disfarçar, o filme de Eberhardt não consegue ocultar o amadorismo de seu roteiro e a pouca inventividade de sua direção, restando assim somente o carisma de Keanu Reeves para sustenta-lo.
É uma boa sustentação, diga-se: Keanu dá um brilho empático e admirável à um personagem que, nas mãos de outro ator, poderia soar apenas aquilo que o roteiro tentar fazer dele. Um boboca.

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