domingo, 12 de julho de 2020

O Último Americano Virgem

Muitos não têm ideia da procedência, mas, o pequeno cul erótico dos anos 1980, “O Último Americano Virgem” é na verdade refilmagem do filme israelense “Sorvete de Limão”, que chegou até mesmo a concorrer ao Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro em 1979.
O mesmo diretor e roteirista Boaz Davidson se incumbiu de transpor a versão de seu trabalho para o contexto norte-americano, encaixando-o com primazia na concepção juvenil e estudantil de então e nos códigos do estilo de comédia que despontava graças à ênfase no apelo sexual já presente na premissa.
“O Último Americano Virgem” ombreia obras marcantes e bem-sucedidas da época, como “Porky’s-A Casa do Riso e do Amor” e “Férias do Barulho”, nas quais sexo é a única coisa que parece ocupar o pensamento dos jovens protagonistas –contudo, seu reconhecimento emblemático dentro desse sub-gênero desvia a atenção para algo que o filme de Boaz Davidson tem de profundamente salutar: Uma hábil e impactante manutenção do drama.
Claro que, muito do que se vê no filme contribui para que ele seja visto como uma mera comédia adolescente erótica: Os jovens estudantes Gary (Lawrence Monoson), Rick (Steve Antin, vilãozinho de “Os Goonies”) e David (Joe Rubbo) são melhores amigos e, na idade em que se encontram, vivem naturalmente em busca de sexo.
Já no início do filme, uma cena dá o tom do humor desavergonhado, mas bastante divertido que irá predominar: Os três carregam outras três garotas para casa de Gary, aproveitando a ausência dos pais deste. Lá, uma festa de improviso rola solta e, pelo menos dois deles –Rick e David –correm o risco de se dar bem, levando suas acompanhantes para os quartos.
Os pais de Gary, então, chegam em casa provocando um grande tumulto –além disso, o gordinho David termina confundindo a mãe de Gary com sua ficante (!!).
Caso o expectador considere esse tipo de humor muito vulgar, e ache que nudez gratuita é um elemento que pode denegrir um filme, meu conselho é que passe longe de “O Último Americano Virgem” –entretanto, se filmes desse apelo não são nenhum problema, este trabalho pode surpreender.
A estrutura que Boaz Davidson confere ao seu filme não poderia ser mais simples: De forma episódica, ele vai relatando as aventuras e desventuras sexuais de seus três protagonistas, ao mesmo tempo em que aprofunda suas dinâmicas por meio disso, diferenciando suas personalidades uns dos outros e alternando os momentos genuinamente engraçados com outros de teor mais sério e melancólico, em meio aos quais quase uma espécie de trama paralela vai se construindo.
Basicamente, durante a sua faceta de comédia –aquela que aparentemente a maioria de seu público mais lembra –“O Último Americano Virgem” enumera as situações em que Gary, Rick e David procuram pelo interlúdio com o sexo oposto. Nelas, quase sempre algo errado acontece; e isso quase sempre leva o pobre Gary (que não tarda a revelar-se o desafortunado protagonista) a ter frustradas suas chances de perder a virgindade; é ele, pois, o tal ‘último americano virgem’.
No entanto, enquanto avança em suas sequências cômicas, o filme também amadurece uma outra trama na qual Gary se descobre apaixonado pela jovem Karen (Diane Franklin, de “Bill & Ted-Uma Aventura Fantástica”) que, por sua vez, cai de amores por seu amigo Rick –de longe, o mais metido a galã dos três; e são impagáveis as expressões de corno manso que o ator Lawrence Monoson exibe nessas cenas...
Sendo seu amigo mulherengo do jeito que é –e sendo o próprio filme malicioso do jeito que é –Gary faz o que pode para impedir Rick de levar a aparentemente inocente Karen para a cama, gerando algumas situações divertidas (como quando sem querer ele desliga o freio do carro e, com todos dentro, faz o veículo despencar num barranco para a água da praia). O tratamento dado ao filme –o de uma comédia descompromissada –nesse trecho em especial, engana o público: Como nas comédias românticas usuais, torcemos para que a mocinha se dê conta de que o amor genuíno do protagonista é mais merecedor dela do que o obviamente cafajeste garoto que só a quer seduzir. Contudo, pouco a pouco, o filme de Boaz Davidson despedaça sadicamente nossas expectativas numa sucessão quase despercebida de pequenos acontecimentos que ocupam o último terço: Depois de tantas tentativas de Gary para impedir o inevitável, Rick e Karen finalmente fazem sexo; ela engravida; ele termina com ela –num gesto até mais brutal e súbito do que esperávamos. Bom moço, Gary faz o possível e o impossível para ajudar sua amada: Junta todo o dinheiro que tem, vende suas coisas, pede empréstimos, tudo para poder pagar o aborto dela. Ao fim, tudo resolvido –e com a garota de sua vida ao seu lado por gratidão –Gary vai à casa de Karen encontrá-la para sua festa de aniversário, mas, eis que ela, na mais absoluta e revoltante cara-de-pau, voltou com Rick outra vez.
O mundo de Gary cai –e, devido ao inesperado dos acontecimentos, essa sensação chega ao expectador também –e ele sai na noite em seu carro, com sua frustração, sua desilusão e sua derrota. E é nesse momento amargo que o filme outrora tão descontraído e hilário de Boaz Davidson decide abandonar o expectador.
A despeito da mensagem extremamente machista que o filme pode passar em relação ao comportamento das mulheres e no repúdio a isso incitado, “O Último Americano Virgem” se fez muito impactante aos jovens expectadores de sua época graças, sobretudo, a esse momento final onde eles experimentaram, incrédulos, um dos mais dolorosos foras do cinema.

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