Lançada em 1986, a animação de Jimmy T.
Murakami, baseada na graphic-novel de Raymond Briggs, somou-se ao contundente “O Dia Seguinte” como um dos mais potentes e perturbadores manifestos contra a
iminência da Guerra Nuclear dos anos 1980.
Por seu caráter absolutamente incomum (uma
animação para adultos de técnicas experimentais), “Quando O Vento Sopra” acabou
ficando bem menos conhecido do que o filme televisivo de Nicholas Meyer; o que
não significa que não tenha seu valor.
A narrativa, bastante restrita, objetiva e
espartana, concentra-se num único casal de personagens principais, Jim e Hilda
(vozes de John Mills e Peggy Ashcroft), casal idoso, moradores da área rural da
Grã-Bretanha, eles testemunham a evolução de um impasse político através dos
noticiários de rádio e televisão.
Acatando instruções do governo com fidelidade
quase canina, Jim constrói um pequeno abrigo em sua residência, feito das
portas de madeira.
Quando por fim uma guerra nuclear eclode, sua
vizinhança é varrida pela força das explosões atômicas, a casa de Jim e Hilda
fica em frangalhos –e a partir daí, podemos ver a fusão nem sempre harmoniosa
de técnicas da animação, quando os dois personagens são desenhados e animados à
mão, e o cenário, a casa destruída à sua volta, é composto de imagens reais e
trucagens de stop-motion.
Tudo está devastado. Não há sinais de vizinhos
sobreviventes. A eletricidade não funciona. Não há água. Contudo, o pior para
Jim e Hilda vem depois: A partir do momento em que tentam se reorganizar,
buscando acreditar que auxílio e notícias mais otimistas virão com o tempo, os
dois velhinhos experimentam o início de uma deterioração física proporcionada
pela radioatividade à qual foram expostos.
Nos dias seguintes, eles são assolados por
dores de cabeça, enjôos, crises de diarreia e feridas súbitas pelo corpo,
sintomas que só vão se agravando cada vez mais.
Jim encontra uma justificativa plausível para
minimizar cada um desses males –velhice, aborrecimentos pós-explosão, revezes
corriqueiros da idade –sempre esperançoso de que o governo, em algum momento
irá os amparar.
No princípio, essa postura parece irritante, ao
fazer dele um falastrão com uma explicação (ainda que ingênua) para tudo na
ponta da língua; entretanto, aos poucos vamos nos conscientizando de que ele
faz isso como forma de proteger Hilda da incerteza e da compreensão aterradora
da morte lenta que os ronda; aos poucos, essa insistência de Jim numa
explicação que até para ele vai soando esfarrapada, começa a nos comover –ele
faz o que faz, afinal, pensando no bem e na paz de espírito da própria esposa.
Talvez por isso, no final
–quando a narrativa se isenta de continuar acompanhando seus protagonistas em
seu sofrimento por mais tempo –Jim e Hilda abrem mão da crença no governo que
nada fez por eles, e abraçam uma crença mais superior e abstrata: Eles rezam,
enfim, para Deus.
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