Embora muitos considerem seu primeiro
longa-metragem, “O Balconista”, como um cult-movie, o diretor e roteirista
Kevin Smith na verdade passou toda sua carreira tentando, de alguma forma,
repetir o êxito obtido em “Procura-Se Amy”, indiscutivelmente sua obra-prima.
Mais esforçado nesse sentido, “Zack And Miri
Make A Porno” –ou “Pagando Bem, Que Mal Tem?” –busca mesclar a visão despojada
que Smith possui dos romances modernos com as gracejos antenados e referenciais
que ele tanto gosta; temperados aqui com o atrevimento inerente ao tema.
O resultado continua sendo uma comédia
romântica onde os jovens apaixonados envolvidos se revelam até castos em seu
amor, embora disfarce essa simplicidade com uma muralha de ousadia, vulgaridade
e, por que não, metalinguagem.
Zack e Miri (Seth Rogen e Elizabeth Banks,
reunidos em cena depois de fazerem juntos “O Virgem de 40 Anos”) são grandes
amigos desde os tempos de colégio.
À beira dos 30 anos, eles moram juntos em
Pittsburgh, e juntos vão de mal a pior: Dividem um apartamento cujas contas
estão todas atrasadas, e eles, prestes a serem despejados.
É durante a reunião da classe estudantil de seu
ano de formatura, onde conhecem o casal de homossexuais vivido por Brandon
Routh e Justin Long (este último, um ator de filmes pornô-gay!), que Zack tem
um lampejo da possível solução: Fazer um filme pornô que, na pior das
hipóteses, terá como público todos aqueles que conheceram ele e Miri.
Afinal, conclui ele, se um video de celular
mostrando Miri sendo espiada exibindo a calcinha tem milhares de visualizações
na internet, um filme pornô protagonizado pelos dois haveria de tirá-los da
penúria.
Com isso, Zack arranja um produtor –Delaney
(Craig Robinson, de “Miss Março-A Garota da Capa”), seu amigo de trabalho numa
cafeteria –e contrata um cameraman (Jeff Anderson) –na verdade, um colega do
time de hóquei –e os atores, Lester (Jason Mewes, intérprete de Jay, parceiro de
Kevin Smith na dupla Jay & Silent Bob) e Barry (Ricky Mabe), e as atrizes
Bubbles e Stacey (as estrelas pornôs Tracy Lords e Katie Morgan).
A trupe arregaça as mangas para realizar a
paródio-pornô “Star Whores” (!) (óbvio que, sendo o fã assumido de “Star Wars”
que é, Kevin Smith não resistiria à tentação de parodiar seu monumento pop
preferido), entretanto, na manhã do início das filmagens, eles perdem todo o
equipamento, figurino e cenários nos quais investiram seu dinheiro: O depósito
alugado pelas filmagens foi posto à baixo assim que seu locatário vigarista
fugiu com a grana (!).
A saída é usar a cafeteria onde Zack e Delaney
trabalham como cenário para as estripulias eróticas (!), o que inclui uma cena
escrita especialmente para Zack e Miri –ou seus personagens, como quiserem...
–antes da qual eles insistem, para os outros e para si mesmos, que será somente
sexo e nada mais; algo que não pretendem deixar interferir na sua longeva
amizade.
Contudo, é visível desde o começo que os planos
no roteiro de Kevin Smith rumam na direção oposta: Zack e Miri, sim, se amam, e
a circunstância um tanto insólita do pornô que resolvem produzir cria a deixa
para darem um passo além na relação que, de outro modo, jamais dariam.
Como lidar com isso é pois a questão que vai
tomando conta do filme quando ele já entra em seu último terço –e quando o
divertido aspecto de ‘bastidores da
pornografia’ vai ficando de lado em prol do romance mais pueril e algo
enfadonho dos protagonistas; em parte porque Kevin Smith já foi muito mais
habilidoso e original ao escrever sobre relacionamentos em outras ocasiões, e
porque Seth Rogen e Elizabeth Banks não têm a mais fervilhante das químicas.
Há certo mérito na forma
graciosa e cheia de propriedade com que Smith consegue evitar que sua obra
despenque para uma apologia ao erotismo –mesmo sendo, a rigor, um risco que
corre do início ao fim –e na tentativa, não completamente bem-sucedida, de
mesclar, já em seu desfecho, as considerações artísticas e narrativas do filme
em produção, com o romance complicado entre Zack e Miri –e, portanto, com o
próprio filme a que pertencem –mas, essas características admiráveis são
eclipsadas pela inclinação de Smith às piadas grosseiras e imaturas que povoam
todos os seus filmes, e pela comodidade de moldar sua obra em função de um
redundante gênero cinematográfico, a comédia romântica.
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