quarta-feira, 12 de junho de 2024

Uma Ideia de Você


 É curioso o que Hollywood tenta fazer com Anne Hathaway: Em “O Diário da Princesa”, filme que a revelou, tentaram convencer o público de que ela era feia (!), em “O Diabo Veste Prada”, de que ela era gorda (!!), e agora, em “Uma Ideia de Você”, de que ela é velha! Anne interpreta Solène Marchand, uma mulher divorciada, mãe de uma adolescente, dona de uma galeria de artes, à beira dos quarenta anos e incerta (quase desiludida) em relação ao amor. Numa inesperada viagem, na qual se vê obrigada a acompanhar a filha e outros dois amigos em um show do Coachela, Solène acaba –por meio de uma série de equívocos certeiros que volta e meia se sucedem na ficção –indo parar no trailer de uma celebridade, um dos membros de uma das boy bands do momento, o jovem cantor Hays Campbell (Nicholas Galitzine, do romance “Vermelho, Branco e Sangue Azul”).

Colhido pela embriaguez do amor à primeira vista, Hays reencontra Solène em outra ocasião logo depois –quando entram, ela e a filha, numa fila para pegar autógrafos –e dedica uma música para ela durante o seu show. Dias depois, acaba indo parar (sob a desculpa de adquirir obras de arte para seu apartamento em Londres) na galeria dela, e assim, de situação em situação –e numa agilidade que os romances quase só encontram no cinema –os dois pombinhos vão se enredando na paixão, sempre com a distância da idade a pesar sobre eles, principalmente para Solène –ainda que, de fato, Anne Hathaway não aparente ter idade para ser mãe dele, ao contrário do que ela própria diz várias vezes ao longo do filme.

“Uma Ideia de Você” é baseado no livro de Robinne Lee, um romance açucarado, antenado às predisposições comerciais e aos anseios românticos de uma determinada parcela do público ao qual o filme deseja de pronto se dirigir: Mulheres, numa idade acima dos vinte e poucos anos. Há, inclusive, um persistente rumor a correr pela internet (negado veementemente pela autora) de que “Uma Ideia de Você”, o livro, teria sido inspirado numa fanfic (uma ficção eventualmente escrita por fãs sem qualquer aspiração comercial ou profissional) protagonizada por Harry Styles, o membro mais proeminente da banda One Direction –e, de fato, embora o filme cautelosamente conserve certa distância de uma caracterização mais explícita, há muito em comum entre o personagem Hays Campbell e a persona real de Harry Styles (entre outras coisas, o fato de serem britânicos).

Ancorado na presença sólida de Anne Hathaway –de longe, o nome mais relevante de todo o elenco –o filme dirigido por Michael Showalter (diretor de “Os Olhos de Tammy Faye”, com Jessica Chastain) parece tão confiante na trama esmiuçada no livro, tão intoxicado pelo apelo certeiro do gênero romântico abordado, que pouco faz além do básico para que seu resultado final se imponha com primazia na tela. Fica no ar uma alusão, não completamente explorada, ao enredo do ótimo “Um Lugar Chamado Notting Hill”, no qual um rapaz comum se envolve romanticamente com uma grande estrela de cinema. No entanto, em “Uma Ideia de Você” são as diferenças entre esses dois filmes que mais parecem se impor: Em primeiro lugar, porque aquela trama era acompanhada do ponto de vista masculino e aqui, atendendo à demanda do público para o qual é feito, o ponto de vista é feminino; em segundo, por “Notting Hill”, muito habilidosamente, se concentrava no árduo e, por que não, divertido processo em que um relacionamento tão assim improvável se materializa e se torna real –em “Uma Ideia de Você”, a concretização do romance até que acontece relativamente rápido e fácil (ou, ao menos, é assim que o filme faz parecer), se debruçando com mais minúcia sobre os contratempos enfrentados pelo casal para manter-se junto. Essa é a questão em torno da qual o filme deseja refletir: O quanto as pessoas –os fãs, a internet, os membros da família, os amigos –se predispõem a opinar e a julgar um relacionamento alheio quando este vem envolto em circunstâncias que fogem do normal (neste caso, a nem tão aparente diferença de idade), e tão mais sujeito ao escrutínio está esse relacionamento quando uma das partes é uma celebridade cuja posse reclamada dos fãs ignora o direito que a pessoa tem de viver uma vida íntima.

Embora seja esse seu diferencial, o filme de Michael Showalter, com suas conclusões melodramáticas, e com a desenvoltura limitada do diretor e de seu elenco de apoio para a encenação de sentimentos conflituosos (além de um desfecho omisso e nada climático), acaba reservando ao expectador um sabor um pouco amargo.

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