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terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

Quero Dizer Que Te Amo


 Vencedor do Oscar 1994 de Melhor Filme Estrangeiro, por “Sedução”, o diretor espanhol Fernando Trueba fez sua estréia norte-americana por meio de caminhos comercialmente viáveis –saiu-se já de cara com uma comédia –e trouxe a tiracolo um astro latino (Antonio Banderas) com o qual provavelmente teria mais compatibilidade durante a produção do que um ator americano.

“Quero Dizer Que Te Amo” deleita-se com a situação de farsa que predomina nesse subgênero específico das comédias, de “Quanto Mais Quente Melhor” até “Tootsie”; no entanto, o que se sucede em cena não é um protagonista se travestindo, mas sim se multiplicando em dois (!).

Art Dodge, personagem de Banderas, é dono de uma galeria de arte em Miami. Sua técnica é ir até velórios e explicar, com a cara mais lavada do mundo, que o falecido comprou-lhe um quadro na semana anterior, levando os familiares a pagar-lhe o valor da obra a partir do benefício da dúvida. Nota-se aí, a predisposição ao embuste de Art.

Todavia, ele mete-se em maus lençóis quando o falecido em questão, no golpe que decide aplicar, é pai de um gangster pouco avesso à amenidades, o colérico Gene (Danny Aiello). Para escapar da encrenca com a pele intacta, Art termina de carona no carro de Betty (Melanie Griffith), ex-esposa de Gene, com quem Art acaba tendo um affair passageiro. Ou, ao menos, ele julgava que seria passageiro: De um dia para o outro, a impulsiva e inconsequente (e à propósito rica...) Betty decide que vai se casar com Art, sem lá muito perguntar a opinião deste. Mas, Art conhece a irmã dela, Liz (Daryl Hannah), completamente diferente, mais centrada e mais ajuizada que a outra, e por ela se apaixona.

Como, porém, conseguir almejar algum romance real com a iminente cunhada proibida, se ela, ainda por cima, não o suporta e o enxerga como um aproveitador barato?

A saída é inventar um irmão gêmeo fictício, Bart (!), e embora o truque se resuma a Art soltar os cabelos presos por rabo-de-cavalo e colocar um par de óculos, a manobra dá surpreendentemente certo, chegando a quase convencer até mesmo seu pai (!) meio senil, Sheldon (vivido com graça e descontração pelo veterano Eli Wallach).

No papel de Bart, o protagonista consegue assim conquistar o coração da até então inacessível Liz, desempenhando o papel de artista engajado que corresponde a ela –na verdade, o próprio Art era um artista frustrado que adotou a malandragem diante de suas desventuras.

O grande problema de Art, no entanto, é a autenticidade de seus sentimentos: Ele se apaixona de fato por Liz, ainda que a data de seu casamento com a irmã avoada, Betty, vá rapidamente se aproximando –e o truculento Gene, ainda apaixonado por Betty e disposto a fazê-la feliz de qualquer maneira, não aceitará ver Art dando o fora nela sem fazer com que pague muito caro por isso!

Herdeiro a um só tempo das comédias italianas (e européias em geral), e das ágeis screwball norte-americanas (todas inspirações para esta obra, não há dúvidas), o filme de Trueba prioriza o humor ao romance, a despeito do cerne ser, o tempo todo, seu triângulo amoroso; para tanto, há espaço de sobra para que brilhem os atores coadjuvantes magistrais (como a secretária vivida pela sempre sensacional Joan Cusack, que esteve com Melanie em –veja só! –“Uma Secretária de Futuro”) e para que se note, em boa luz, o timing cômico impagável de Banderas, até então soterrado em projetos norte-americanos que buscaram vendê-lo como o estereótipo do amante latino no cinema.

Foi nesta produção charmosa e agradável –ainda que ocasionada por certa redundância corriqueira –que Banderas e Melanie se conheceram vindo a se casarem poucos meses depois. Com efeito, percebe-se nitidamente que a química dele com Melanie flui muito melhor do que com Daryl Hannah –o par romântico de fato –o que agrega ao filme um ligeiro desequilíbrio em sua condução e nas impressões passadas ao expectador.

Nada que comprometa esta diversão descompromissada, despretensiosa e rasteira.

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

A Era do Rádio

Antes de ele próprio virar referência, a carreira de Woody Allen teve, em seu início, uma fase profundamente referencial, onde as maiores influências eram nitidamente Federico Fellini e Ingmar Bergman. E, como todo o apreciador de Fellini que se preza, era questão de tempo até que Allen quisesse fazer o seu próprio “Amarcord”.
Assim como sua fonte de inspiração, o filme de Allen –voltado para o período de sua infância num bairro nova-iorquino nos anos 1940, ao lado de sua espalhafatosa família, todos ao redor do rádio –é estruturado em forma episódica.
Dessa maneira, enquanto acompanhamos o menino Joe (vivido por Seth Green, mas cujas peripécias são narradas pelo próprio Woody Allen que nunca aparece), vemos também, em paralelo, outros personagens girando ao seu redor, ou que têm suas vidas diretamente relacionadas ao rádio como veículo de comunicação –como é o caso de Sally White (Mia Farrow, esposa de Allen na época) que, de garçonete assediada e abusada (e, depois, marcada para morrer por testemunhar acidentalmente a atividade de um assassino de aluguel divertido e metódico interpretado por Danny Aielo) torna-se uma grande estrela depois que consegue domar sua voz estridente.
O rádio é assim o elemento que une um inventário de histórias de sabor irresistivelmente nostálgico e que remete a uma encantadora sensação agridoce em seu realizador que ele procura compartilhar com o expectador: A narrativa hilária sobre o desafortunado jogador de beisebol vítima de uma sucessão de acidentes que o foram ‘desmontando’ (!); os assaltantes que atendem à ligação aleatória de um programa de rádio (ao estilo “Qual É A Música?”) e, após responder corretamente todas as perguntas, conseguem um prêmio considerável para os donos da casa que foram assaltar; a seqüência em que a atriz Denise Dumont, fazendo as vezes de cantora brasileira, canta “Tico Tico”; a brusca e breve mudança de tom promovida pela trágica história da menina Polly Phelps –que, com poucos anos de vida, caiu dentro de uma pequena tubulação, mobilizando toda comunidade –noticiada pelos locutores com solícito pesar; a vibrante cena em que os membros da família, contagiados, começam a cantar “Carioca” interpretada pela inconfundível Carmem Miranda (numa sucessão de cenas em que Allen enumera suas músicas preferidas do período e as recordações que vêem com elas); a tia azarada e solteirona (Dianne Wiest, maravilhosa) que, durante um encontro noturno, houve ao lado do pretenso namorado a histórica narração radiofônica de Orson Welles adaptando “Guerra dos Mundos” –e entram em pânico, julgando que é real –a belíssima cena musical com Diane Keaton; a bela moça que os garotos espiam dançando nua ao som da música do rádio em seu apartamento só para, mais tarde, descobrirem que é a nova professora.

Como Fellini, Woody Allen narra esses e outros eventos com uma satisfação e um encantamento de alguém que resgata as memórias de infância como se fossem um diamante precioso, e no distanciamento que o tempo lhes deu, adquiriram assim um brilho, um glamour e um deslumbre que somente o cinema seria mesmo capaz de incorporar.

domingo, 26 de julho de 2015

Era Uma Vez Na América

Quando começa "Era Uma Vez Na América", o que vemos é uma série de cenas que não fazem o menor sentido: Uma desconhecida é assassinada por pistoleiros mafiosos mal-encarados. O personagem de Robert De Niro surta convulsivamente enquanto fuma ópio (e tais cenas podem interferir, ou não, na narrativa). Um incêndio. Um telefonema. Um corte que salta pelo menos uns vinte anos.
Durante a primeira hora de filme a impressão é de que pegamos a história pela metade -ou, como foi o meu caso quando assisti em VHS, parece que foi colocada a segunda fita no aparelho, ao invés da primeira!
Mas, não: Tudo faz parte de um plano minucioso, acalentado (por anos, inclusive) pelo diretor italiano Sergio Leone que durante boa parte de sua carreira sonhou em conceber este filme (e teve, portanto, tempo de sobra para elaborá-lo em sua mente, num nível de detalhamento e meticulosidade que atingem patamares raros na história do cinema).
Assim sendo, após vários personagens e situações estranhas desfilarem pela tela, lá pelo começo do segundo terço do filme é que o diretor Sergio Leone irá regredir a história a algumas décadas no passado, por meio de um flash-back genial, levando-nos, junto de seus personagens, àquele que é, de fato, o início da história: A Nova York do início do século XX, quando Noodless (personagem que virá a ser de De Niro) e sua turma, ainda crianças iniciam uma progressiva ascensão na hierarquia da ainda emergente máfia judaica no chamado East Side. A partir daí, as pontas soltas da narrativa irão lentamente se juntar e mesmo as cenas mais complicadas passarão a fazer sentido.
Muito tempo depois de "Era Uma Vez Na América" acabar, você vai se descobrir refletindo os detalhes desta história, que não é apenas sobre gangsteres, mas sobre pessoas que, apesar do "sonho americano", tiveram que trair e lutar pela sobrevivência, por uma vida melhor.
Como em qualquer parte do mundo.