Existem alguns filmes que já nascem clássicos.
Ao assistí-los, somos invadidos por aquela rara sensação de que, por mais
recentes que sejam, estamos vendo uma obra destinada a ser um clássico moderno,
um filme do qual gerações iram falar e comentar nos anos vindouros.
Poucas foram as vezes em que tive essas
sensação, mas um delas ocorreu em 1999, quando vi pela primeira vez “O Resgate
do Soldado Ryan”, e fiquei assombrado já em sua meia hora inicial, quando
testemunhamos a cena da invasão das praias da Normandia pelos aliados, e somos
arremessados num caos assombroso de destruição e morte.
É uma cena que Spielberg atreveu-se a filmar
com inéditos realismo e transgressão, valendo-se de uma linguagem documental e
de uma montagem nunca menos que primorosa. A forma como ele escolheu registrar
este filme poderoso tornou-se moda em todos os filmes subseqüentes que tratavam
de cenas de conflito, ainda que em 1986, um filme desconhecido, o bielo-russo “Vá
e Veja” já trouxesse muitos dos artifícios muito bem empregados por Spielberg.
Contudo, o filme que se segue àqueles trinta
primeiros minutos acachapantes não é menos que magnífico: Sobreviventes daquele
mesmo episódio, um grupo de soldados liderados pelo capitão Miller (Tom Hanks
em uma de suas mais sensacionais interpretações) acaba por receber a mais
incomum das missões; em uma guerra onde todos morrem aos borbotões, eles são incumbidos
de encontrar e trazer de volta para casa um único soldado, James Francis Ryan,
o mais novo de cinco irmãos, todos falecidos em combate.
Como no também primordial “A Lista de Schindler”
salvar uma única vida, como os soldados iram descobrir, vale todo o esforço do
mundo.
Um passo definitivo na direção do cineasta
sério e respeitado que Spielberg veio a se tornar, “Soldado Ryan” é repleto de
considerações e momentos magníficos, onde percebemos a diferença que faz um
grande diretor: Sua maturidade surge em diversas situações, como na do soldado
covarde que deixa um alemão matar seus inimigos ou na comovente revelação de
quem o ancião do início do filme realmente é, e os motivos que o levaram até
aquele cemitério. Spielberg parece por vezes se conter em sua tentativa de manipular
as emoções do espectador; sua abordagem intenciona ser o de um documentarista,
tanto que demoramos a perceber o quanto é bela e funcional a trilha sonora de
John Willians.
Tal qual outros primorosos filmes que vieram
depois, como “Munique”, Lincoln” ou “Ponte dos Espiões”, o diretor, famoso por
fantasias como “E.T.”, parece abordar a História como forma de lembrar que a
maldade que deflagrou acontecimentos atrozes no mundo é um lembrete, para que
eles nunca se repitam.
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