Após o sucesso sem precedentes de crítica e
bilheteria da Trilogia “Senhor dos Anéis”, no início da década de 2000, era
inevitável que a atenção de Hollywood em geral, e dos produtores na franquia em
particular, se voltassem para as outras obras de J.R.R. Tolkien, sobretudo para
“O Hobbit”, um prelúdio literário para “O Senhor dos Anéis” com um tom
ligeiramente mais leve, mais próximo de um conto infantil.
O diretor vencedor do Oscar (justamente por “O
Retorno do Rei”) Peter Jackson, logo depois de dois projetos um pouco pessoais
(a refilmagem de “King Kong”, sobre a qual já foi falado, e a adaptação de “Um
Olhar do Paraíso”), resolveu se dedicar à roteirização e à produção dessa nova
obra, deixando a direção inicialmente à cargo de Guilhermo Del Toro.
Mas o quê começou como o projeto de um único
filme, não só tornou-se dois (e depois três!), como também consumiu um tempo
longo de gestação, provocando o afastamento de Del Toro, e levando assim, Peter
Jackson a assumir novamente a direção.
O quê nos leva, assim, ao primeiro filme desta
Trilogia “Hobbit”, “Uma Jornada Inesperada”.
Voltamos à Terra Média, desta vez, cerca de
sessenta anos antes dos eventos narrados nos outros filmes (o quê não impediu
os roteiristas de usar alguns recursos para garantir a participação de Elijah
Wood –o Frodo –e de outros membros do elenco de “Senhor dos Anéis”, como
veremos mais adiante).
Junto de seu querido sobrinho Frodo, o hobbit
Bilbo Bolseiro (no início, interpretado pelo mesmo Ian Holm, mas na juventude,
interpretado magnificamente por Martin Freeman, o Watson da série inglesa
“Sherlock”) relembra um marcante episódio de sua juventude, quando fora
recrutado pelo mago Gandalf (Ian McKellen) –que mais tarde se tornaria seu
grande amigo –ao lado de uma comitiva de anões, para uma empreitada rumo ao
reino-anão de Erebor usurpado pelo dragão Smaug.
Pelo caminho, eles encontram perigos e toda a
sorte de seres mágicos habitantes da Terra Média, bem como personagens que
serão fundamentais no desenrolar da aventura a ser vivida futuramente pelo
próprio Frodo. Como prelúdio da inesquecível trilogia cinematográfica assinada
inclusive pelo mesmo Peter Jackson, era inevitável que “O Hobbit” despertasse interesse
no público, o quê se refletiu na boa bilheteria.
Contudo, as platéias que foram conferi-lo no
cinema não deixaram de notar que, embora sensacional e cheio de momentos de
encher os olhos, este filme não era uma experiência à altura de "Senhor
dos Anéis".
A saída de Guilhermo Del Toro removeu
justamente o elemento que poderia trazer todo o frescor diferencial para este
projeto.
Na continuação, "A Desolação de
Smaug", reencontramos o grupo já muito próximo do reino de Erebor.
Bilbo acompanhado de Gandalf, bem como do
outrora rei, Torin Escudo de Carvalho (Richard Armitage) e toda sua comitiva de
anões, chegam à Floresta das Trevas, reduto de um reino elfico protegido por um
certo Legolas (Orlando Bloom, outra presença resgatada da trilogia anterior).
Logo, essa jornada repleta de perigos os levará à esplendorosa Cidade do Lago e
depois disso, ao reino-anão que um dia foi do pai de Torin, agora ocupado por
uma fera cuja periculosidade o tornou uma lenda: o terrível dragão Smaug.
Jackson deu um ritmo mais dinâmico a este segundo
filme, certamente numa reação às críticas não muito positivas dirigidas ao
primeiro filme, considerado mais enrolado e disperso.
Todavia, o grande mal que acometeu essa nova
trilogia –e que se torna particularmente explícito aqui –é de natureza prática:
“O Senhor dos Anéis” era uma trilogia de livros convertida sabiamente numa
trilogia de filmes. Já, “O Hobbit” era um único filme, com uma história até
mais leve que o épico protagonizado por Frodo, a decisão de estendê-lo todo em uma
nova trilogia –com cada capítulo ultrapassando, com margem, as duas horas de
duração –exigiu que muito material adicional (e com freqüência, desnecessário)
fosse feito, resultando numa produção que tenta desesperadamente replicar os
valores admiráveis de produção da trilogia anterior, mas que parece ignorar o
fato de que tudo o mais é “encheção de lingüiça”!
O último filme recebeu o pomposo (e
estranhamente impróprio) título de “A Batalha dos Cinco Exércitos”.
O dragão Smaug escapa da fortaleza de Erebor
(deixando suas riquezas para Torin e seus amigos), mas oferece uma ameaça sem
precedentes aos moradores da Cidade do Lago. Depois, com o dragão morto e suas
moradias destruídas, os habitantes irão recorrer ao restituído rei anão –auto
intitulado “Rei Sob A Montanha” –para receberem algum abrigo.
Mas, Torin está com a febre do ouro e falta com
sua palavra, o quê faz com que, às portas de Erebor se reúna um exército de
homens e outro de elfos a fim de se opor ao contingente de anões, liderados por
sua vez, por Dain Pé de Ferro.
Todos serão surpreendidos pelas forças de orcs
que trairão e atacarão a todos.
O interesse do expectador é, portanto, bastante
comprometido quando se chega neste terceiro e derradeiro filme, no qual o
pecado cometido por Peter Jackson (o de estender seu prelúdio de “O Senhor dos
Anéis” além do necessário) se torna mais visível: Personagens inteiros,
concebidos exclusivamente para esta versão cinematográfica, como Tauriel
(Evangeline Lilly) e sua intrigante relação com um dos anões, não encontram
qualquer respaldo da narrativa quando chega a hora de juntar todas as pontas
soltas, o quê termina por comprometer o protagonismo de Martin Freeman (que,
como Bilbo, parece estar mais perdido que surdo em bingo!), e por conseqüência,
o antagonismo do rei élfico Thranduil (Lee Pace) e até mesmo do dragão Smaug
(voz de Benedict Cumberbath).
O fiasco está longe de ser completo, mas ficou
claro que nem mesmo a própria equipe original era capaz de reproduzir a magia
que pulsava de “O Senhor dos Anéis”.
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