terça-feira, 20 de setembro de 2016

A Bela e A Fera

Esta obra-prima da animação carrega a honra de ser o primeiro desenho animado da história do cinema a receber uma indicação ao Oscar de Melhor Filme (em 1991, numa época em que as indicações à categoria principal eram restritas à cinco disputadíssimas vagas!).
No início daquela década, ao mesmo tempo em que experimentava um renascimento técnico e artístico por meio da simultânea consagração dos longa-metragens concebidos por sua segunda geração de animadores –sendo “A Pequena Sereia” o seu divisor de águas –os Estúdios Disney também já esgotavam a cota de contos de fadas clássicos a serem adaptados. Das poucas histórias ainda restantes, era o enredo famoso do príncipe tornado monstro por uma maldição, e que só poderia regressar à forma humana se conseguisse fazer com que uma jovem se apaixonasse por ele enxergando, não sua aparência externa, mas sua nobreza e seu bom coração.
E a Disney soube capturar a essência desse conto com extrema propriedade (como ignorar o arrojo técnico, somado ao amplo efeito emocional de uma cena inesquecível como a seqüência no salão de dança?).
A construção de seus personagens é primorosa e, embora todos sejam dignos de nota, é preciso ao menos ressaltar o trio principal; A Fera é notável em suas ambigüidades. Ele começa agressivo, feroz e soturno, personificando o monstro vilanesco, mas aos poucos vai desconstruindo a opinião formada do expectador e manifesta características humanas como a honradez, a gentileza, a compaixão e (o mais incrível) o medo da rejeição.
A Bela é uma personagem extraordinária em seu equilíbrio. Uma protagonista forte, ainda que não seja um arquétipo de panfletagem do empoderamento feminino, ela é vulnerável sem ser a clássica donzela em perigo, agrega simultaneamente elementos tradicionais das heroínas da Velha Hollywood à qualidades pulsantes nas protagonistas contemporâneas como independência de pensamento e opinião.
E, se os protagonistas têm uma atenção toda particular do roteiro, o antagonista também tem, surgindo, sobretudo, para enfatizar a própria mensagem da trama; Gaston, o vilão da história pode até confundir, numa primeira impressão, as crianças mais novas, já que ele possui todas as características físicas de um príncipe encantado (imagem –ou melhor, estereótipo –que a própria Disney ajudou a difundir): É bonitão, altivo, galante, vistoso e forte.
É justamente nessa ambigüidade que a Disney encontra o grande trunfo da produção, e que diferencia “A Bela e A Fera”, em termos morais, de tudo que o estúdio fez antes: Gaston tem, sim a aparência de um príncipe encantado, mas um coração vil, arrogante e rancoroso. É exatamente o oposto de Fera, que nos cativa, apesar do aspecto bestial, devido ao fato perene e genial de ostentar um olhar, durante todo o filme, carregado de ternura.

Uma lição e tanto para as fãs de “Cinderella”, que cresceram acreditando que seriam felizes para sempre desde que encontrassem seu príncipe encantado, alheias ao fato do tipo de pessoa que ele poderia ser.

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