terça-feira, 13 de outubro de 2020

A Minha Versão do Amor

 


A vida a partir da perspectiva de sua finitude já era o prisma pelo qual se descortinava o belo best-seller de Mordecai Richler, e essas impressões são preservadas aqui, na medida do possível, pela narrativa atenta, dedicada e minimalista do diretor Richard J. Lewis.

Por meio dela, acompanhamos Barney Panofsky, protagonista que tem diferentes fases da sua vida investigadas –e em todas elas sua verve politicamente incorreta ganha a excelência de Paul Giamatti.

Do alto de sua velhice, ainda a frente de uma certa Tottaly Unnecessary Productions (!), ele é abordado por um policial frustrado e amargurado (Mark Addy, de “Ou Tudo Ou Nada”), escritor de um livro obscuro e fracassado sobre uma implicante teoria que colocaria Barney como principal culpado da morte de seu melhor amigo, Boogie (Scott Speedman, de “Anjos da Noite”). Essa é a senha para o filme retroceder cerca de quarenta anos no tempo, até 1972, na Itália quando, na companhia do próprio Boogie e dos outros amigos, Cedric (Clé Bennett) e Leo (Thomas Trabacchi), Barney encontra sua primeira esposa, a instável Clara Chambers (Rachelle Lefevre, de “Crepúsculo”), com quem acaba se casando devido à súbita gravidez dela. A criança infelizmente nasce morta e Barney descobre na mesma ocasião que não era o pai –e o abandono ressentido dele leva Clara ao suicídio.

Anos depois, já trabalhando em Nova York, Barney conhece sua segunda esposa, vivida por Minnie Driver (de “Gênio Indomável”), uma moça da família rica –cujo comportamento do pai e da mãe gera imediato contraste com o jeitão despreocupado e desmazelado do pai dele (Dustin Hoffman).

É durante sua cerimônia de casamento que Barney conhece aquela que ele se convence ser a mulher sua vida (!), a austera, sublime e encantadora Miriam (Rosamund Pike). Entretanto, Barney é casado e, embora lhe mande flores toda a semana, Miriam se recusa a ceder aos seus avanços.

Curiosamente, é o próprio Boogie quem lhe dá a deixa para se divorciar: Transando com sua esposa na casa de campo (!). Apesar de não sentir-se exatamente revoltado com ele, Barney encena, no calor da hora, algumas recriminações triviais de velhos amigos, quando, num incidente cercado de incertezas, Boogia cai no lago e nunca mais é visto (Ele teria se afogado ao se jogar? Teria sido atingido pela bala da arma de Barney que disparou sem querer? Teria, afinal, morrido mesmo? Já que o corpo nunca foi mais achado?).

Após essa estranha circunstância, Barney vai atrás de Miriam com quem, após alguma insistência, consegue enfim se casar e ter dois filhos ao longo de alguns bons anos de um casamento feliz.

No entanto, no livro de Richler e no filme de Lewis, o final não corresponde necessariamente ao momento em que o protagonista alcança o ápice de sua felicidade –como o seria em tantas outras histórias de formato convencional –e com isso, a trama avança até a meia-idade, quando a insegurança e os anseios egoístas de Barney o levam a perder a mulher que ama.

Acompanhamos também sua velhice –ou seja, uma fase até além daquela em que presenciamos o filme começar –e testemunhamos a angustiante constatação de Barney diante da própria senilidade e, portanto, do fim da vida.

Os minutos finais do personagem, já quase privado de si mesmo, e na companhia dos filhos adultos, o levam ao alívio de descobrir, enfim, toda a improvável verdade sobre o desaparecimento de Boogie –um elemento inusitado da narrativa que a engrandece com sua brilhante e curiosa atenção aos detalhes mais inesperados.

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