quarta-feira, 11 de novembro de 2020

A Caminho da Lua


 A pequena garota chinesa Fei Fei (voz de Cathy Ang) vive um luto: A morte prematura da mãe, o que levou-a, à propósito, a podar desordenadamente as longas madeixas pretas. Entretanto, seu pai (voz de John Cho) lhe despertar perplexidade ao demonstrar ter superado a perda; já ronda pela casa, com prudência e cautela, uma nova namorada e que traz, a tiracolo, ainda por cima, um garotinho, Chin (voz de Robert G. Chiu), candidato à irmão de Fei Fei.

Como toda adolescente que se preze, Fei Fei não reage bem à mudança e, numa tentativa de se reconectar com a mãe falecida, ela monta uma nave espacial (!?) com planos de chegar até a Lua, onde viveria a deusa Chang’a, das histórias que ela lhe contava. Fei Fei acredita que, provando a existência da deusa, seu pai deixaria a nova namorada e seguiria enaltecendo o espírito da esposa anterior.

Lá pelas tantas, Fei Fei, de uma maneira um pouco torta, consegue seu objetivo de ir à Lua com sua coelhinha de estimação, Pulinho –não sem antes levar consigo Chin como clandestino –e acaba descobrindo que lá há todo um reino, Lunária, governado pela própria Chang’A (voz de Phillipa Soo).

Contudo, Chang’A não é exatamente o que se esperava: Vaidosa e egocêntrica, ela é idolatrada como uma superstar pelos seres que vivem lá, bolinhos da lua (!), produzidos inclusive a partir de suas próprias lágrimas.

A presença de Fei Fei ali nada mais é, para Chang’A, do que uma conveniência: A menina sem saber traz uma espécie de presente mágico com o qual Chang’A pode obter uma poção que permitirá o retorno de seu amado Houy, o amante mortal de Chang’A cuja lenda diz que ficou na Terra enquanto ela, em sua imortalidade, ascendeu para a Lua.

É curiosa a abordagem do luto, da vaidade e da idolatria nesta animação produzida exclusivamente pela Netflix –estão em pauta muitos assuntos atuais como o empoderamento (nesse sentido, a personagem Chang’A tem mal-disfarçadas semelhanças com Elsa, de “Frozen”), as famílias disfuncionais, a percepção da morte em meio à infância e a sublinhada beleza da cultura oriental chinesa. Visualmente, “A Caminho da Lua” não poupa recursos para se fazer deslumbrante num jogo de cores tão intenso e intermitente que deve até exacerbar os expectadores mais adultos. Esse empenho visual, a estrutura de seu roteiro, a metodologia que norteia seus personagens, e até suas mensagens morais seguem à risca a fórmula estabelecida pelos Estúdios Disney –inclusive com o acréscimo um tanto desnecessário de um bichinho fofo para cada um dos protagonistas –e. nesse sentido, não é a toa que a direção da obra leva a assinatura do animador Glen Keane (veterano das fileiras da Disney e vencedor do Oscar 2018 de Melhor Curta-Metragem pelo emocionante “Dear Basketball”).

Se tal objetivo não é por inteiro atingido, em parte, porque quase nenhuma de suas canções se revela memorável, apesar da profusão com que são jogadas na tela, e porque as emoções almejadas pela realização nem sempre se mostram genuínas (caso da química nada eficaz entre a dupla de potenciais ‘irmãos’), por outro lado, “A Caminho da Lua” tem à seu favor o mérito de nunca ceder às obviedades –à despeito do peso dúbio que fornece ao andamento da trama, Chang’A nunca é tratada como uma vilã –e o fato de que muitos dos próprios exemplares legítimos da Disney, às vezes, sofrem e falham na tentativa de ombrear a fórmula bem administrada de seus clássicos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário