Dirigido por Laurent Bouzereau, este documentário comemora o aniversário de 50 anos da obra-prima “Tubarão”, de Steven Spielberg, esmiuçando passo à passo a criação deste filme lendário que marcou profundamente a cultura pop, contando com imagens de arquivo, bastidores e depoimentos.
É o próprio Steven Spielberg quem dá início ao
filme, revelando que “Tubarão” representou um divisor de águas em sua carreira:
Com um início ativo na TV, Spielberg já havia dirigido episódios de séries,
feito o longa-metragem televisivo “Encurralado”, tão bom que chegou a ser
exibido em salas de cinema (como atesta o fã Guillermo Del Todo), e estreado no
cinema com o drama “Louca Escapada”. Seu projeto seguinte, portanto, definiria
a percepção que o público, a crítica e a indústria teriam dele como cineasta
dali para frente.
E quis o destino que esse projeto fosse
“Tubarão”.
Escrito pelo romacista Peter Benchley,
inspirado em ideias nascidas de suas experiências litorâneas e do documentário
sobre vida marinha “Morte Branca em Água Azul”, o livro “Tubarão”, com sua
mistura de suspense, informação e ambientação pouco usual, havia se tornado um
sucesso editorial, despertando o interesse dos produtores Richard D. Zanuck e
David Brown que logo compraram os direitos de adaptação. Foi o próprio
Spielberg, então com 26 anos, quem ofereceu-se para dirigir o filme.
As locações escolhidas, a fim de recriar o
ambiente muito pitoresco da cidadezinha fictícia de Amity, foram na cidade
costeira de Martha’s Vineyard, em Massachusetts, e a pré-produção foi iniciada
a partir do momento em que o designer de efeitos práticos Joe Alves junto de
sua esmerada equipe deram início à construção do tubarão –uma criatura
animatrônica de 8 metros de extensão, mais tarde, batizada por Spielberg de
‘Bruce’ em alusão ao nome de seu advogado!
Os principais nomes escalados para os
protagonistas foram Roy Scheider, Robert Shaw e um jovem Richard Dreyfuss –fora
outros cinco nomes hollywodianos, aqui e ali, do elenco coadjuvante (tais como
Lorraine Garry, Murray Hamilton e Susan Blacklinie, a mocinha presente na
impactante sequência de abertura), todos os demais personagens e participações
foram deliberadamente escolhidos por Spielberg entre as pessoas da própria
comunidade de Martha’s Vineyard, a fim de garantir a maior autenticidade
regional possível.
“Tubarão” teve suas filmagens iniciadas sem um
roteiro integralmente definido –havia certa indecisão dos produtores e do
diretor quanto aos elementos que deveriam ser removidos do livro, como um
romance (que julgavam desnecessário) e os aspectos pontuais –e esse foi só o
primeiro dos inúmeros contratempos: Quando chegou a hora de usar o tubarão
Bruce, cujo aspecto artesanal recriava magnificamente um tubarão-branco real, a
equipe se deu conta de que haviam construído um animatrônico para funcionar em
água doce; na água salgada, ele apresentava mau-funcionamento uma vez que a
salubridade comprometia o equipamento eletrônico –isso levou o diretor
Spielberg a valer-se de criatividade, sugerindo a presença da criatura através
de inúmeros truques de cena inspirados na linguagem de suspense do mestre
Alfred Hitchcock. Também outros acidentes são relatados, como o afundamento de
um dos barcos da produção, a bordo do qual estavam câmeras, a equipe técnica, o
diretor e toda a aparelhagem de som.
É, porém, na bem-humorada implicância dos
atores Robert Shaw (falecido em 1978) e Richard Dreyfuss que alguns dos
depoimentos mais se detêm. Representando personagens antagônicos, os dois
intérpretes, um veterano e calejado, outro jovem e ávido, levaram parte desse antagonismo
para a realidade, fazendo com que o diretor Spielberg a criasse subterfúgios
com os quais improvisava cena após cena a fim de capturar o realismo daquela
dinâmica. Fruto desse processo é a cena da qual, segundo Spielberg, ele mais se
orgulha em todo o filme: O momento em que os três protagonistas estão dentro da
cabine do barco, à noite, compartilhando experiências. O monólogo maravilhoso
perpetrado por Robert Shaw (onde é incluído na narrativa o precedente real do
fatídico ocorrido com os marinheiros americanos do U.S.S. Indianápolis, durante
a Segunda Guerra Mundial) foi acrescentado de última hora no filme pelo
co-roteirista Carl Gottlieb e depois lapidado, na noite anterior à filmagem,
pelo próprio Robert Shaw (ele mesmo, um escritor e dramaturgo já renomado).
É contado que, nos meses de sua realização, em
função das alardeadas complicações nos bastidores, o cronograma de “Tubarão”
estourou, levando Spielberg e sua equipe a experimentar um pesadelo –muitos
foram aqueles que chegaram a afirmar para Spielberg que aquele filme arruinaria
sua carreira.
Já durante a pós-produção, após finalmente ser
concluída uma filmagem que parecia interminável, o músico John Williams
(colaborador de Spielberg desde “Louca Escapada”) revela ter se inspirado nos
acordes de Bernard Herman para “Psicose” a fim de criar a icônica trilha sonora
de “Tubarão”, sem sombra de dúvidas, uma das mais marcantes do cinema.
Quando aportou nos cinemas em 1975, “Tubarão”
recompensou o empenho e o talento de Spielberg quando tornou-se o primeiro blockbuster da era moderna –as filas de
cinema contornavam quarteirões, dando origem a um fenômeno de bilheteria que
teria continuidade dois anos depois com “Star Wars”, de George Lucas. Indicado ao
Oscar de Melhor Filme (perdendo para “Um Estranho No Ninho”) e vencendo os de
Melhor Trilha Sonora, Melhor Som e Melhor Montagem, “Tubarão” deu a Spielberg o
status de autor cinematográfico com o qual, a partir dali, foi capaz de decidir
o corte final de cada uma de suas obras (a começar por seu projeto seguinte, o
personalíssimo “Contatos Imediatos do 3º Grau”). A influência e admiração
irrestritas que a obra desperta são perceptíveis nos depoimentos de diretores
como James Cameron, Steve Sodenberg e J.J. Abrahams, e de colegas próximos de
Spielberg, como George Lucas, Martin Scorsese, Francis Ford Coppola e John
Milius.
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