sexta-feira, 24 de março de 2017

Cool World - Mundo Proibido

Existem dois filmes diferentes que não se harmonizam nada bem em “Cool World-Mundo Proibido” de Ralph Bakshi, e isso diz respeito essencialmente ao seu próprio diretor: Um, é a animação irredutível, irreprimível e caótica, ocasionada por rompantes de absurdo e escatologia nitidamente impregnados em seus personagens e nas próprias regras (ou falta delas) no mundo a que pertence; o outro, é o filme com atores de carne e osso, cuja narrativa engessada, maniqueísta e insatisfatória chega a contrastar com os momentos em cartoon.
Como animador, Ralph Bakshi sabe ser exuberante, impetuoso, atrevido e revigorante (características muitas vezes associadas ao seu mais cultuado trabalho, o desenho para maiores “O Gato Fritz” de 1972), já como diretor de atores, sua técnica é tímida, seus enquadramentos são redundantes e a condução de seus atores soa quase indiferente.
Esse desequilíbrio é o grande problema do qual “Cool World” padece.
Por aí, nota-se então a imensa propriedade com que Robert Zemeckis soube, em 1989, mesclar numa narrativa plausível e gratificante os desenhos animados e os atores reais no seu revolucionário “Uma Cilada Para Roger Rabbit” –aliás, eis uma resenha que precisa ser feita dentro em breve!
Talvez, inspirado por essa nova possibilidade, Bakshi saiu de sua aposentadoria (anunciada em 1983) para, em 1992, realizar esta nova junção de animação e live-action, pegando carona no sucesso de “Roger Rabbit”, mas com um diferencial: Uma trama obscura, lúgubre até, que abria margem para uma saudável subversão, onde entravam como ingredientes muito adultos a sensualidade, a esquizofrenia e até mesmo a melancolia.
Na trama, mal sabe o cartunista Jack Deebs (Gabriel Byrne) que o mundo que criou no papel, Cool World, uma cidade animada e surreal povoada por seres destrambelhados, existe de fato. Quando vai parar dentro desse mundo, ele conhece a voluptosa Holly Would (uma versão animada –e igualmente sinuosa –de Kim Basinger, na época o grande símbolo sexual do cinema), que planeja aproveitar sua presença ali para escapar daquele lugar: Ela sabe que, ao transar com ele, um humano, ela irá se tornar uma pessoa de carne e osso (e aí, entra em cena a própria Kim Basinger, numa interpretação sensacional), podendo viver no mundo real, ainda que isso seja sumariamente proibido.
Um dos únicos personagens humanos a viver no Cool World vem a ser o amargo detetive Harris (Brad Pitt, cuja atuação coloca no bolso a do protagonista Byrne), ele próprio apaixonado por uma personagem de desenho, mas consciente do perigo que pode ser deflagrado ao se romper as regras: A harmonia entre os dois mundo pode ser quebrada, destruindo-os!
Apesar dessas idéias promissoras, e da francamente imperdível presença de Kim Basinger, pouca coisa em “Cool World” funciona de verdade. Até mesmo a animação, em termos técnicos, apesar da desenvoltura e experiência do diretor Ralph Bakshi, fica bastante aquém de muitas obras que foram produzidos naquele mesmo período.
Vale, sobretudo, pela curiosidade em ser um filme absolutamente fora dos padrões, objetivo que sempre pareceu nortear a busca criativa do eclético e incomum Bakshi.

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