Existem dois filmes diferentes que não se
harmonizam nada bem em “Cool World-Mundo Proibido” de Ralph Bakshi, e isso diz
respeito essencialmente ao seu próprio diretor: Um, é a animação irredutível,
irreprimível e caótica, ocasionada por rompantes de absurdo e escatologia
nitidamente impregnados em seus personagens e nas próprias regras (ou falta
delas) no mundo a que pertence; o outro, é o filme com atores de carne e osso,
cuja narrativa engessada, maniqueísta e insatisfatória chega a contrastar com
os momentos em cartoon.
Como animador, Ralph Bakshi sabe ser
exuberante, impetuoso, atrevido e revigorante (características muitas vezes
associadas ao seu mais cultuado trabalho, o desenho para maiores “O Gato Fritz”
de 1972), já como diretor de atores, sua técnica é tímida, seus enquadramentos
são redundantes e a condução de seus atores soa quase indiferente.
Esse desequilíbrio é o grande problema do qual “Cool
World” padece.
Por aí, nota-se então a imensa propriedade com
que Robert Zemeckis soube, em 1989, mesclar numa narrativa plausível e
gratificante os desenhos animados e os atores reais no seu revolucionário “Uma
Cilada Para Roger Rabbit” –aliás, eis uma resenha que precisa ser feita dentro
em breve!
Talvez, inspirado por essa nova possibilidade,
Bakshi saiu de sua aposentadoria (anunciada em 1983) para, em 1992, realizar
esta nova junção de animação e live-action, pegando carona no sucesso de “Roger
Rabbit”, mas com um diferencial: Uma trama obscura, lúgubre até, que abria
margem para uma saudável subversão, onde entravam como ingredientes muito
adultos a sensualidade, a esquizofrenia e até mesmo a melancolia.
Na trama, mal sabe o cartunista Jack Deebs
(Gabriel Byrne) que o mundo que criou no papel, Cool World, uma cidade animada
e surreal povoada por seres destrambelhados, existe de fato. Quando vai parar
dentro desse mundo, ele conhece a voluptosa Holly Would (uma versão animada –e igualmente
sinuosa –de Kim Basinger, na época o grande símbolo sexual do cinema), que
planeja aproveitar sua presença ali para escapar daquele lugar: Ela sabe que,
ao transar com ele, um humano, ela irá se tornar uma pessoa de carne e osso (e
aí, entra em cena a própria Kim Basinger, numa interpretação sensacional),
podendo viver no mundo real, ainda que isso seja sumariamente proibido.
Um dos únicos personagens humanos a viver no
Cool World vem a ser o amargo detetive Harris (Brad Pitt, cuja atuação coloca
no bolso a do protagonista Byrne), ele próprio apaixonado por uma personagem de
desenho, mas consciente do perigo que pode ser deflagrado ao se romper as
regras: A harmonia entre os dois mundo pode ser quebrada, destruindo-os!
Apesar dessas idéias promissoras, e da
francamente imperdível presença de Kim Basinger, pouca coisa em “Cool World”
funciona de verdade. Até mesmo a animação, em termos técnicos, apesar da
desenvoltura e experiência do diretor Ralph Bakshi, fica bastante aquém de
muitas obras que foram produzidos naquele mesmo período.
Vale, sobretudo, pela
curiosidade em ser um filme absolutamente fora dos padrões, objetivo que sempre
pareceu nortear a busca criativa do eclético e incomum Bakshi.
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