Escrito e dirigido pelo mesmo David O’Russell que surpreendeu público e crítica com “O Lado Bom da Vida” e “Trapaça”, “Amsterdam” passou despercebido quando foi lançado em 2022. A intriga verborrágica, mirabolante e intrincada que ele descortina (ainda que ampara em fatos reais, a chamada Conspiração Empresarial de 1933) não caiu no gosto dos expectadores, e a condução de O’Russell –como sempre, inclinada ao fascínio por tipos disfuncionais e por uma sistemática estranheza –não ajudou a tornar mais apetecível uma obra que, em sua indefinição, parece não pertencer a gênero nenhum: Durante suas mais de duas horas de duração, “Amsterdam” reúne elementos de film noir, suspense conspiratório, drama, comédia de humor negro e thriller político, tudo numa roupagem desigual que remete à década de 1930.
O enredo cheio de melindres gira em torno de
três grandes amigos: Os soldados Burt Berendsen (Christian Bale), Harold
Woodman (John David Washington, de “Resistência”) e a enfermeira Valerie
(Margot Robbie). Em meados de 1918, Burt e Woodman se conheceram no front da Primeira Guerra Mundial e logo
foram despachados para o hospital em que Valerie servia. A amizade foi
instantânea –bem como o romance entre Harold e Valerie –e os três logo fugiram
para Amsterdam a fim de viver um sonho até o limite do tolerável.
Entretanto, Burt, casado com a abastada
Beatrice Vandenheuvel (Andrea Riseborough), precisou voltar para a América,
trazendo Harold à reboque. Quinze anos depois, os dois trabalham numa clínica
médica de quinta categoria para soldados veteranos em Nova York –Burt como
médico-cirurgião, Harold como advogado –quando são procurados por Elizabeth
Meekins (a cantora Taylor Swift), certa de que seu pai, o Senador Meekins, não
morreu de causas naturais ao voltar de uma viagem à Europa.
Durante a autópsia, perpetrada por Burt e pela
enfermeira Irma St. Clair (Zoe Saldaña), eles descobrem que o Senador foi
envenenado e, quando dão por si, são tragados para dentro de um furacão: Na
sequência, Elizabeth é assassinada, a culpa recai sobre Burt e Harold que logo
se tornam os principais suspeitos aos olhos da polícia –personificada nos
paspalhos personagens de Matthias Schoenaerts e Alessandro Nivola. Ao fugirem,
Burt e Harold dão início à sua própria investigação a fim de limpar seus nomes,
quando reencontram novamente Valerie, e vão descobrindo uma trilha de pistas
que irá levá-los até um influente político de Washington (Robert De Niro) e,
por fim, à uma terrível verdade acerca de um mal inominável que começa a
despontar em certos governos totalitários da Europa, como a Itália e a
Alemanha, E acredite, essa é só a ponta do iceberg!
Uma sinopse descrita em características normais
não dá conta das idas e vindas, da deliberada excentricidade e da atmosfera de
incomum ironia que persiste durante todo o tempo no filme de O’Russell, e
embora esse elemento seja certamente grande parte de seu charme e
diferenciação, ele é também seu calcanhar de Aquiles –o diretor O’Russell
sempre foi muito afeito à esquisitices pontuais em suas narrativas. Em alguns
casos, esse gosto curioso e apurado resultou em obras que foram capazes de
contornar o estranhamento para surpreender ou até emocionar seu público; em
outros –sobretudo seus trabalhos de início de carreira como a bizarra comédia
romântica “A Mão do Desejo”, o inconformista “Flying With Disaster” e o filme
sobre e para loucos (!) “Huckabees” –o produto final acabava sendo tão distante
das convenções que simplesmente não se revelava palatável ao público. É esse o
caso, aqui, de “Amsterdam”.
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