terça-feira, 5 de setembro de 2017

Joana D' Arc

Para além da forma indissociável que esta personagem histórica imbricou na cultura pop como uma espécie de representante do protagonismo feminino (cujas referências se encontram em trabalhos como “Jogos Vorazes”), esta estilizada versão é transparente, sobretudo, no modo como reflete as aspirações de seu realizador, o francês Luc Besson.
Terceiro projeto de Besson após sua mudança para os EUA na década de 1990 –os anteriores foram o notável “O Profissional” e o mirabolante “O Quinto Elemento”, no qual conheceu a atriz Milla Jovovich que aqui nomeou protagonista –a produção parece reunir um conceito bastante norte-americano e corporativo: É, deveras, de uma conveniência muito mercadológica à Hollywood juntar em um único projeto de ares grandiloquentes um realizador francês notório por seus filmes de ação e uma personalidade histórica da França num épico (repleto de cenas de ação, veja só!) com o aval do cinemão norte-americano.
Os executivos, talvez, só não pararam para enxergar o quanto este projeto poderia destoar da própria postura de Besson como autor –e, de repente, nem ele próprio!
De fato, a direção de Besson soa ligeiramente oprimida aqui, embora ele ainda consiga fazer o que é inerente em todos os seus filmes: Levar um senso de observação íntima que dialoga espirituosamente com sua afinada percepção de espetáculo.
Difícil dizer, na conclusão final a que leva o filme, se essa observação pertence mais à Besson ou ao estúdio que o financiou.
Comprovando toda a desenvoltura para cenas de ação que ela já havia demonstrado em “O Quinto Elemento” (e que levou-a a estrelar a infame franquia “Resident Evil”), Milla Jovovich surge, num registro bastante desigual, como Joana, uma inocente garota camponesa dos interiores da França que testemunha a barbárie dos invasores perpetrada contra sua aldeia e sua família.
Anos mais tarde, já adolescente, e com a França ainda em convulsão devida à sua instabilidade política e religiosa, Joana torna-se uma guerreira afirmando que seus passos são na verdade dados a partir de desígnios fornecidos por entidades celestiais que se comunicam com ela.
No terço final, ela é feita prisioneira pelos ingleses e submetida a um julgamento cujo teor inquisitivo e meticuloso visa sabotar sua fé; entretanto, a própria Joana será, ela mesma, confrontada com os questionamentos de seus fantasmas.
No esforço de tentar ser mais do que um outro filme a tentar levar novo enfoque á célebre história de Joana D'Arc (fato que o torna passível de comparação com uma infinidade de obras que vão desde o clássico mudo “A Paixão de Joana D’ Arc”, de Carl Theodor Dreyer, até o filme homônimo de Victor Fleming, estrelado por Ingrid Bergman, só para citar os mais ilustres), este trabalho converge seus detalhes no fato de que, desta vez, a história é contada por um esteta cultuado e munida de todos os recursos tecnológicos à disposição de uma produção hollywoodiana. Não obstante o fato de, por isso mesmo, Besson revelar-se aqui mais convencional que de costume, a maior diferenciação deste projeto é a abordagem curiosa que o filme parece fazer das motivações de sua personagem principal: Na atuação definida pelo olhar maníaco de Milla Jovovich e, em especial, na condução questionadora de ordem fantasiosa que ele dá à meio hora final (onde a alardeada participação do grande Dustin Hoffman se concretiza), o filme de Besson parece fazer algo que os que vieram antes dele não se atreveram (ou não tiveram o mau gosto de tentar...), ele confronta Joana D’ Arc com a possibilidade de sua própria loucura.

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