terça-feira, 17 de setembro de 2019

Luxúria de Vampiros

O segundo filme da “Trilogia Karnstein”, por muito pouco, não é uma obra quase independente de relações com o filme anterior, salvo a constante menção do sobrenome Karnstein e uma situação de datas esboçada numa das primeiras cenas (onde é sugerido que os eventos do outro filme se sucederam cerca de quarenta anos antes), embora o roteirista Tudor Gates e os produtores Harry Fine e Michael Styles permaneçam os mesmos.
Há um prólogo nada esclarecido, mas bastante inteligível, onde vemos um casal de vampiros (Barbara Jefford e Mike Raven, ele fazendo uma esmerada recriação dos trejeitos do Drácula de Christopher Lee) num ritual em que entregam o sangue de uma virgem em sacrifício perante um esqueleto.
O sangue traz o esqueleto de volta à vida, e o que vemos então –sem que hajam explicações mais minuciosas –supostamente deve ser a vampira do filme anterior, Carmilla, reencarnada agora nas formas esculturais da atriz dinamarquesa Yutte Stensgaard; é bom lembrar que ela nunca é chamada por esse nome aqui adotando como alcunha para todos os outros o anagrama Mircalla.
O filme se inicia logo após os créditos que veem em seguida, e introduz o herói trágico, o bon vivant Richard Lestrange (Michael Johnson). Recém-chegado ao vilarejo, Lestrange desdenha do temor local dos moradores pela famigerada Mansão Karnstein, a tal ponto que decide subir até a montanha onde ele está.
Chegando lá, uma surpresa: Nos arredores da mansão há uma escola só para garotas (!), povoada por alguns dos mais tentadores rabos de saia que a Hammer já colocou em um filme!
Ávido por estar em meio a tantas beldades, Lestrange executa uma manobra típica de malandro e consegue convencer o novo professor de literatura a partir para uma viagem enquanto fica em seu lugar.
Todavia, a predileção de Lestrange não tardará em eleger uma favorita; e que vem a ser justamente a belíssima aluna recém-chegada, Mircalla, cuja beleza atrai pelo menos duas vítimas antes de Lestrange: A sua jovem companheira de quarto (no mais próximo que o filme chega da sugestão lésbica do filme anterior), e o incauto professor de história (Ralph Bates). O que desperta as suspeitas da única personagem sensata de todo o filme, a professora Playfair (Suzanna Leigh), que também tem lá a sua atração não correspondida por Lestrange.
Mircalla é assim, para o casal de vampiros que a despertou, e que acompanha seus passos com certa onipresença embora muito pouco interfiram na trama, uma predadora perfeita na maneira com que seduz suas vítimas sem lhes oferecer escapatória; e a contagem de pessoas desaparecidas começa a alarmar a preocupada, ainda que displicente, diretora da escola (Helen Christie).
Contudo, apesar desse papel que exerce, Mircalla cede de fato às intenções românticas de Lestrange (um romance entre um vampiro e um humano, décadas antes da “Saga Crepúsculo” e da obra-prima “Deixa Ela Entrar”) e com isso um impasse começa a se desenhar: Mircalla obedecerá seus instintos predatórios de vampira, ou penderá para o lado de Lestrange reiterando sua paixão e poupando-o da morte? –ainda que, no fim das contas, o roteiro de Tudor Gates não saiba o que fazer com esse subterfúgio, terminando por descarta-lo de modo quase banal em seu desfecho.
O diretor aqui encarregado, Jimmy Sangster, emprega a nudez e a sensualidade com mais economia do que em “Carmilla-A Vampira de Karnstein”, o que é curioso numa continuação quando a tendência comum é sempre tentar superar o filme original, a atriz Yutte Stensgaard não tem o mesmo magnetismo de cena que a sensacional Ingrid Pitt, e ainda faz um olhar vesgo nas cenas de êxtase que quase descamba o filme para a comédia involuntária, mas é bela e escultural o bastante para monopolizar muito da atenção do expectador.
Inferior ao seu antecessor, mas ainda assim prazeroso de se assistir, “Luxúria de Vampiros”, na forma com que evoca seus elementos, parece mais ser uma espécie de recriação auto-referente das características mais marcantes de “Carmilla” e das maiores obras da Hammer do que uma produção propriamente dita, indícios lamentáveis da decadência que o famoso estúdio inglês experimentaria na década de 1970.

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