Lembrado especialmente por seu trabalho em “Rambo-Programado Para Matar”, o diretor australiano Ted Kotcheff demonstrou capacidade e habilidade (além de insuspeita versatilidade) em vários outros projetos, infelizmente bem menos reconhecidos que a aventura que lançou Stallone ao estrelato.
Certamente a obra que o colocou no radar de
Hollywood veio a ser este sufocante conto sobre ciclos viciosos que ele
realizou em sua Austrália natal, parte da profusão de obras cheias de identidade
e personalidade que surgiram abundantes por lá nos anos 1970 e 80, integrando o
movimento hoje conhecido como ozploitation.
Ao iniciar o filme, somos testemunhas da
insatisfação crônica do Prof. John Grant (Gary Bond) para com sua situação
presente: Lecionando crianças interioranas numa estação no meio do nada, ele
conta as horas e os minutos para a chegada de suas férias, quando planeja
partir de lá num trem a caminho da capital, Sydney, onde sonha encontrar a
namorada e com ela, de repente, partir para a Inglaterra.
Contudo, as paradas inevitáveis de trens, o
obrigam a hospedar-se provisoriamente numa cidadezinha em algum lugar em meio
ao trajeto, de nome Yabba, habitada por caipiras sintomaticamente
hospitaleiros, sujos e beberrões; o lugarejo e seus habitantes de pronto
suscitam a irritação em Grant, tão superior se sente e tão pretensioso de
ver-se longe de tudo aquilo ele está. Mas, a narrativa de Kotcheff corresponde
a um castigo divino: Ao pernoitar num hotel, crente de que partiria no dia
seguinte, Grant vai a um bar local e lá se embebeda junto do xerife, para logo
em seguida convencer-se de participar de jogos de apostas em andamento ali por
perto e, com isso, perder todo o dinheiro que tem.
Gradualmente convertido num dos indivíduos que
ali vivem –suas roupas brancas vão ganhando a mácula da sujeira, seus modos
rígidos vão se tornando desmazelados, e suas atitudes vão espelhando cada vez
mais os violentos bêbados locais –Grant encontra um senhor que lhe oferece
bebida e pouso em sua casa; e, nela, sua filha oferece à Grant também sexo, o
que aparentemente ela oferece a todo homem do lugar (!).
“Pessoas de bolsos vazios conseguem sobreviver
relativamente bem em Yabba” é o que lhe conta o médico vivido por Donald
Pleasence, que lhe recebe em sua casa nos dias tumultuados que se seguem. Ele é
um reflexo de Grant: Também escolado, também vindo da cidade grande e,
provavelmente, também dono de sonhos mais ambiciosos no passado, mas capturado
em Yabba pela bebedeira constante à que são submetidos pelos insistentes
convites hospitaleiros, enredado pela amizade viril com os brutamontes locais
que o fazem parte dos hábitos bizarros como a caçada à cangurus (em cenas reais
feitas de forma francamente chocante).
Logo, Grant percebe que, do alto de sua presunçosa
superioridade, não se deu conta de que eles o prenderam ali também: Sem
dinheiro para sua própria independência de ir e vir,morando com o médico num
barraco caindo aos pedaços, fazendo parte de sua rotina insensata de loucuras,
bebedeiras e farras inconsequentes, e dependendo da boa vontade daqueles que
não cessam de lhe empurrar cerveja goela abaixo, Grant não consegue, durante
dias, desvencilhar-se daquela circunstâncias –porque os detalhes nunca lhe
ajudam; porque nunca a situação lhe parece urgente o bastante para tratá-la com
seriedade; e porque a embriaguez não lhe permite um pensamento muito austero
acerca disso.
Em suma: Uma armadilha onde a vítima parece ser
seu próprio futuro.
Mesmo em um momento, quando um instante de
epifânia o leva a partir dali numa carona, eis que o destino conspira contra o
protagonista, levando-o, por um acordo mal-entendido com um caminheiro, a ser
levado de volta para Yabba, ao invés de para longe dela.
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