sexta-feira, 26 de novembro de 2021

Venom - Tempo de Carnificina


 Desde a cena pós-crédito de “Venom” já ficou claro em torno do que giraria a sua continuação: O vindouro embate entre o anti-herói Venom (originado dos quadrinhos da Marvel onde foi um antagonista do Homem-Aranha) e um inimigo ainda pior, o Carnificina (também ele oriundo dos quadrinhos). Vivido por Woody Harrelson, o Carnificina, ou melhor, Cletus Kassidy, é o típico retrato histriônico que o cinema costuma fazer de um psicopata –irrequieto, impulsivo, irradiando periculosidade.

É esse assassino –introduzido num prólogo onde descobrimos o laço que o une à jovem e igualmente perigosa Shriek (Naomi Harris, de “Moonlight” e “Piratas do Caribe-No Fim do Mundo”) possuidora de superpoderes –quem Eddie Brock (Tom Hardy) vem a visitar, seja na mencionada cena pós-crédito do filme anterior, seja no início deste filme. Eddie é jornalista, e seu ofício atrai o interesse de Cletus, então encarcerado e a caminho da pena de morte por injeção letal. O porque de Cletus ter essa, digamos, obsessão em nomear Eddie como seu confidente é um dos inúmeros lapsos sem muita justificativa que povoam o claudicante filme realizado por Andy Serkis.

Gênio da captura de performance –ele personificou Gollum, de “O Senhor dos Anéis-As Duas Torres” e Cesar em “Planetas dos Macacos-A Origem” –Andy Serkis, é de se presumir, tinha também um intrínseco conhecimento do uso cênico da computação gráfica, o que deve tê-lo gabaritado para dirigir este trabalho –no qual, sobretudo sua dupla principal, depende dos efeitos visuais para se fazer convincente –em substituição à Ruben Fleischer, diretor do original.

Nesse quesito –dos efeitos computadorizados –ele até se sai bem (“Tempo de Carnificina” tem a fluidez, a beleza e a precisão minimamente necessárias aos grandes blockbusters, mas isso é tão lugar comum que mal consta como trunfo), entretanto, onde realmente importa (a condução narrativa) o filme encontra inúmeros obstáculos, que começam a se somar logo quando sua premissa (bem) básica inicia sua construção: Em uma das várias entrevistas que se seguem, Cletus consegue atacar Eddie, tirando um pouco de sangue dele.

O sangue de Eddie, como sabemos desde o primeiro filme, está  contaminado com o simbionte alienígena Venom e, a partir da gota ingerida por Cletus, dá origem à um novo simbionte, Carnificina que, para resumir a coisa toda, cresce, liberta Cletus da prisão e se transforma numa verdadeira máquina de matar.

Tudo que ele almeja, a partir daí, é reencontrar e libertar Shriek, presa numa instituição governamental –único lugar que comporta seu poder, um grito devastador.

Nesse ínterim, o –vamos dizer –‘relacionamento’ entre Eddie e Venom não vai bem: O alienígena, vaidoso por acreditar ser o responsável por Eddie ser quase uma espécie de superherói, reluta cada vez mais em aceitar as regras impostas por seu hospedeiro humano, como a de nunca devorar os cérebros humanos dos desafetos que encontra. Com esses atritos constantes, a compatibilidade de Eddie e Venom se vê comprometida justamente quando ambos estão a beira de enfrentar o Carnificina, cujo simbionte quer Venom (seu pai) morto; e cujo hospedeiro (Cletus) quer Eddie morto!

Essa –pasmem –é uma das poucas motivações que fazem algum sentido no filme.

Há, por exemplo, Eddie, insistentemente retratado como um fracassado, enquanto Venom, no roteiro terrivelmente simplista, surge como uma criatura exclusivamente norteada por seus instintos; um é irritante por sua repetição (pois, o primeiro filme já batia muito nessa tecla), o outro, por sua implausibilidade (ao mesmo tempo que se apresenta já inserido em hábitos da civilização, comporta-se como se houvessem outros que ele desconhece). Assim, sem um bom protagonista fica difícil para o expectador comprar seu antagonista: Embora Woody Harrelson seja sempre hábil no registro da uma vilania inconsequente, toda vez que seu personagem deixa essas áreas (em especial, ao investir na relação com Shriek) ele derrapa. O poder dela –seu grito destruidor –é exatamente o ponto fraco de ambos os simbiontes, do bem e do mal, e ainda que nas boas intenções dos realizadores, eles quisessem que essa fosse uma dinâmica intrigante e curiosa, na prática, isso não leva a lugar algum, culminando em contradições ocasionados no desfecho que desafiam a vontade do público em continuar acompanhando o filme.

Se há um mérito real em “Tempo de Carnificina”, ele está no fato de que é objetivo e enxuto com seus noventa e sete minutos de duração –isso, e a presença inebriante, segura e apaixonante da maravilhosa Michelle Williams, anos-luz melhor que todo o resto do filme: e mesmo assim sua participação é básica e mal aproveitada –no mais, a continuação do filme de 2018 (que apesar do entretenimento diverito que era já possuía preocupante inclinação para o genérico) se mostra desanimadora e pouco atrativa; é um sinal de alerta, afinal, quando sua intrigante cena pós-crédito (sim, este filme também tem uma!) chama muito mais a atenção do que todo o longa-metragem que veio antes dela.

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