O diretor Brian Trenchard-Smith foi um dos mais prolíficos no ciclo do ozploitation (filmes realizados na Austrália em meados dos anos 1970 e 80 de apelo extremamente popular), possuidor de admiradores do quilate de Quentin Tarantino, Trenchard-Smith elaborou, ao lado de vários compatriotas que fizeram do cinema australiano de então um manancial desigual, curioso e inconformista, inúmeras obras cult, entre elas, o notável épico de guerra “Comando de Heróis”. Datado de 1986, provavelmente sua obra mais notória é “Dead End Drive-In” cujas características dialogam muito com o estilo e com a cultura com os quais trabalhos cinematográficos vindos da Austrália eram concebidos. “Dead End Drive-In” é, por exemplo, construído em torno de um contumaz fetiche em torno dos automóveis em constante movimento que observamos em tela, tanto quanto o eram os carros em perseguição na Saga “Mad Max” –e essa maneira profundamente peculiar de filmar os veículos, suas colisões e a objetificação de seus embates de metal é algo essencial da parte dos realizadores australianos, impossível de ser replicado, por exemplo, por diretores norte-americanos.
Também o enredo de “Dead End Drive-In” guarda
similaridades intrigantes com o clássico obscuro “Pelos Caminhos do Inferno”:
Em ambos, um protagonista se vê mergulhado num ambiente auto-contido que não
tarda a converter-se num pesadelo do qual ele deve dispor de recursos cada vez
mais desesperados para escapar. Uma apaixonada referência da parte do diretor
Trenchard-Smith, talvez.
A exemplo de “Mad Max”, a trama do filme se
situa num futuro distópico, cujas características os créditos iniciais tratam
de tentar elucidar ao expectador: As cidades viraram uma terra-sem-lei com a
chega dos anos 1990 e com uma sucessão de levantes populacionais. As ruas são
dominadas por desordeiros e o papel da polícia é, quando muito, recolher os
estragos de toda a violência. Nesse mundo anarquizado e sem esperança, vive o
protagonista Jimmy, apelidado Crabs (Ned Manning). Diferente de seu falecido
pai e de seu irmão mais velho Frank (Ollie Hall), ambos fortes e grandalhões,
Crabs é franzino e baixinho, ainda que metido à valentão –adjetivos que deixam
sua mãe aflita toda a vez que ele se atreve a sair porta afora.
Numa dessas ocasiões, Crabs pega o carro de seu
irmão emprestado e junto de sua atual ficante Carmem (a bela Natalie McCurry)
vai até um drive-in assistir um filme
para descontrair. Contudo, naquele futuro à beira da barbárie, o drive-in em questão não possui função
recreativa: Ele é mantido por forças policiais como uma espécie de campo de concentração
para os desocupados que eventualmente ele atrai. Trocando em miúdos, Crabs e
Carmem, enquanto assistem ao filme no telão têm os pneus de seu carro roubados.
Impossibilitado de partir, Crabs é obrigado a esperar, mas, com o passar dos
dias (sim, dias!) ele percebe estar sendo ludibriado e fomenta planos para
escapar dali, diferente da horda cada vez mais crescente de alienados que se
encontram prisioneiros.
No entanto, os planos de Crabs são
paulatinamente frustrados. Se ele obtêm pneus (roubando de latarias acidentadas
que chegam todos os dias em jamantas), eles então consomem com sua gasolina; se
ele consegue enfim a cobiçada gasolina (roubando dos policiais truculentos que
patrulham a área com a clara intenção de não deixar ninguém sair), eles então
removem, na surdina, o próprio motor do carro (!).
A medida que o desespero e a indignação com
esses infortúnios vão deixando Crabs cada vez mais nervoso e inconformado,
Carmem vai paralelamente se adaptando à rotina do lugar, no qual os aprisionados,
sem ter o que fazer, a não ser beber e aguardar dentro de seus carros o filme
de todas as noites, criaram uma espécie de comunidade repleta de códigos,
posturas e condutas, ainda que inicialmente tudo aparente ser uma total
escatologia.
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