Legado –esse parece ser o principal tópico em torno do qual giram os enredos da Fase 4 do Universo Marvel Cinematográfico, desde o final da “Saga do Infinito” cuja trama trouxe, à reboque, seus cerca de vinte primeiros filmes. Embora suas ambições narrativas tenham se estendido também para as séries do TV (das quais esta é um dos exemplares), a intenção de conectividade em suas histórias permanece mais forte do que nunca, bem como a intenção de manter uma similaridade na qualidade cinematográfica de seus produtos. Entretanto, com os heróis principais dizendo adeus (seja pela chegada no desfecho de suas trajetórias, seja pelo fim do contrato de seus intérpretes, seja, na maioria dos casos, por conta das duas razões), a Marvel em geral, e a Fase 4 em particular acabaram abordando justamente a questão do legado, a passagem de bastão de um personagem, já veterano, para outro, em início de jornada.
Esta minissérie, “Falcão e O Soldado Invernal”,
vem a falar sobre os dilemas de Sam Wilson (Anthonie Mackie), mais conhecido
como Falcão, depois que ele recebeu do agora aposentado Steve Rogers, o Capitão
América em pessoa (que é bastante mencionado, mas, nunca aparece de fato), o
seu poderoso e simbólico escudo, o que o torna, consequentemente, o novo
Capitão América. No entanto, como a série tratará de mostrar ao longo de seus
nove episódios, herdar tal legado não é uma tarefa simples, ainda mais para
alguém como Sam que, diferente do quase ariano Steve Rogers, é um homem negro,
ciente do descaso e das injustiças que seus pares sofreram (e, por vezes,
continuam a sofrer) ao longo de toda a história dos EUA.
Ao abranger um tema de incontornável seriedade,
a série sabiamente evoca ritmo, espírito e atmosfera de “Capitão América-OSoldado Invernal”, dirigido por Anthony e Joe Russo, um dos longa-metragens
responsáveis por tornar o Capitão América um dos maiores heróis do estúdio.
Como naquele estupendo trabalho, aqui, o roteiro lembra por vezes o de um
thriller de espionagem, inclusive com o surgimento de um grupo dissidente de
supostos terroristas, os Apátridas, lutando por uma ideologia que, na teoria,
parece fazer um certo sentido: Unir todo o mundo num povo só, abolindo todas as
fronteiras. Na prática, porém, os objetivos desse grupo armado esbarram nas
complicações do mundo real, reagindo a elas com violência e terror. Sam Wilson
e James ‘Bucky’ Buchanam Barnes (Sebastian Stan), outrora o Soldado Invernal,
tentando se redimir de seu passado como assassino controlado pela Hidra, se
unem para tentar deter os Apátridas quando descobrem que os membros do grupo
têm, de alguma forma, o soro do Supersoldado, o que lhes possibilita força e
velocidade assombrosas. Há, porém, um problema: Sentindo-se incapaz de
corresponder à herança como Capitão América, Sam entrega o escudo ao governo
dos EUA que nomeia um combatente condecorado, o soldado John Walker (Wyatt
Russell, filho de Kurt Russell e Goldie Hawn), como novo Capitão, um homem que,
à medida que as missões começam a cobrar-lhe sacrifícios maiores, se revela
instável.
Dirigida (por Kari Skogland) e escrita (por
vários, com predominância do criador, Malcolm Spellman) com insuspeita
habilidade, a minissérie avança sabendo habilmente centralizar Sam e seu
notável protagonismo, no objetivo de evidenciar ao público o quão certeira é
sua escolha como novo Capitão América –algo, diga-se, seguido à risca do que se
passou nos quadrinhos. Quando conhecessem a líder dos Apátridas, Karli Morgenthau
(Erin Kellyman, de “Han Solo”), os heróis descobrem que ela não é a vilã
translúcida e unilateral que outrora enfrentariam sem pestanejar –o mundo atual
não tem mais conflitos ‘preto no branco’ como nos tempos da Segunda Guerra
Mundial, e alguns inimigos da paz têm justificativas carregadas de significado
e mérito em seus atos. Na busca por respostas, Sam e Bucky tiram de sua prisão
o tentacular e manipulador Barão Zemo (Daniel Brühl, reaproveitando
brilhantemente seu personagem de “Capitão América-Guerra Civil”) que os acaba
levando até a ilha de Madripoor (um sensacional cenário vindo direto dos quadrinhos
da Marvel e que já sugere, em algum momento, a proximidade dos “X-Men”) onde
reencontram a renegada Sharon Carter (Emily Vancamp), personagem que traz
algumas reviravoltas inesperadas. É Sam quem deve se provar o ponto de
equilíbrio entre muitos desses personagens superpoderosos em rota de colisão,
até porque sua própria escolha como Capitão América é, em si, uma mensagem de
igualdade e justiça para todos –e para isso, ele deve encontrar a verdade sobre
o próprio legado conhecendo Isayah Bradley (Carl Lumbly, da série
“Alias-Codinome:Perigo”) e sua amarga história como primeiro supersoldado
negro.
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