A carreira do astro Arnold Schwarzenegger havia chegado num ponto de estagnação na segunda metade da década de 1990. Astro absoluto do cinema de ação nas bilheterias –como atestavam produções como “Exterminador do Futuro 2” e “True Lies” –ao lado, talvez, de Sylvester Stallone, ele havia atingido uma espécie de ‘topo do Olimpo cinematográfico’. A necessidade de reinventar-se (e de, portanto, parar de repetir-se) levou-o a flertar com a política já na década de 2000, como é mostrado no formidável documentário “Arnold”.
Contudo, ainda naquele período, meados de 1995,
Schwarzenegger ainda fazia filmes. E após mais sucessos do que fracassos
(basicamente o grande exemplar, nesse caso, é “O Último Grande Herói”), havia
uma espécie de ‘fórmula’ que Arnold involuntariamente havia criado para si, e
que ninguém mais era capaz de imitar: Filmes de ação pancadaria, mas com
insuspeito requinte cinematográfico (à cargo normalmente de bons diretores que
entendiam do riscado como James Cameron e John McTiernam), tramas simplificadas
sempre voltadas à criação do personagem que Arnold interpretaria e do contexto
quase sempre mirabolante que o envolve, e bordões, muitos bordões –que, quando
funcionavam, tornavam-se memoráveis na exótica voz do astro, tais como “I’ll be
back!” e “Hasta la vista, baby!”, ambos da Saga “Exterminador do Futuro”.
Lançado em 1996, “Queima de Arquivo” preenchia
cada um desses pré-requisitos: Era dirigido por Chuck Russell (que, pouco tempo
antes, surpreendeu o público com o ótimo “O Máskara”), e trazia um personagem John
Krugger que combinava feito uma luva com o perfil de Schwarzenegger; Agente
especial da agência governamental conhecida como WitSec (uma silga para Witness Security Program), Krugger é um
perito na sua especialidade –devidamente esboçada na cena inicial; Sempre que
uma testemunha crucial de um julgamento movido contra poderosos influentes se
vê ameaçada, Krugger é acionado a fim de proporcionar à pessoa a proteção que
autoridades normais não seriam capazes. Uma espécie de Programa de Proteção à
Testemunha aprimorado.
Na WitSec, Krugger é, de longe, o agente mais
bem-sucedido, o mais eficaz e o mais incorruptível –características que dão uma
bela massagem de ego no astro Schwarzenegger –no entanto, sua mais desafiadora
missão ainda virá, quando a executiva Lee Cullen (a belíssima cantora, modelo e
atriz Vanessa Williams), com o auxílio algo claudicante do FBI, tentará
incriminar seus empregadores, fabricantes de armas que estão fornecendo
armamento high-tech para inimigos dos
EUA. Protegida com extremo desleixo pelo FBI, e ameaçada de morte por seus
antigos patrões, Lee se torna ainda mais importante para o caso quando as provas
levantadas contra a empresa armamentista são destruídas, restando somente as
cópias de tais documentos feitas pela própria Lee, capazes de incriminar a
todos. Ela então é imediatamente encaminhada para John Krugger que, nesta
missão, terá de não só valer-se de toda sua perícia para fazer Lee escapar de
seus algozes com vida –algozes estes que terão, à sua disposição, inclusive,
toda a parafernália futurista de armamento que a empresa para a qual trabalham
produz! –como também precisará enfrentar a corrupção dentro da própria WitSec,
uma vez que agora o outrora mentor de Krugger, Robert Deguerin (o veterano
James Caan), se encontra também na folha de pagamento dos poderosos em
julgamento.
A direção inventiva de Chuck Russell e o
carisma inabalável de Arnold Schwarzenegger –aliado à presença sensual de
Vanessa Williams que, curiosamente, não engata com ele qualquer vínculo amoroso
–até que disfarçam o fato de que “Queima de Arquivo”, a toda hora, luta contra
sua própria tendência recorrente de ser uma produção genérica –eles criaram um
personagem, John Krugger, cujo background
até sinaliza com toda uma mitologia a ser expandida e explorada em possíveis
continuações (que nunca vieram), conceberam cenas de ação projetadas para
constar na galeria das mais memoráveis do cinema-pipoca do período (as duas
mais notáveis certamente são o audacioso salto quase sem para-quedas de um jato
727 em pleno voo e o tiroteio de armas futuristas no zoológico do Central Park,
com crocodilos à solta), e ainda bolaram até um bordão um pouco bobinho (“Sorria,
você foi apagado!”) dito por Arnold nos trailers, mas no filme falado apenas
por um figurante... –nada disso, entretanto, conseguiu fazer com que “Queima de
Arquivo” se destacasse em meio à filmografia de Schwarzenegger, pontuada de
produções de ação relevantes de verdade, nem tampouco fazê-lo sobressair-se nas
bilheterias daquela temporada.
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