Mais do que uma celebração do grande e consagrado diretor Vittorio De Sica (aqui, mais descontraído e bem-humorado que
em seus contundentes dramas neo-realistas), e do famoso par Sophia Loren e
Marcelo Mastroianni –que interpretam todos os protagonistas –este trabalho
ganhador do Oscar de Melhor Filme Estrangeira em 1965 celebra a atriz Sophia
Loren (por sinal, casada com o produtor Carlo Ponti), seja pela intérprete
prodigiosa (e nesse sentido é de uma generosidade admirável, o fato de
Mastroianni se prestar a ser sua escada), seja estonteante mulher de beleza e
formosura acachapantes.
Como na tradição do cinema cômico realizado na
Itália nos anos 1950 e 60, o filme é episódico, composto assim de três
média-metragens (sendo o episódio do meio tão curto que quase é um
curta-metragem!). A unir seus enredos, além do casal central –que demonstra
versatilidade em personagens díspares –há a percepção temporal sugerida por seu
título.
O primeiro episódio “Adelina” leva o nome da
protagonista encrencada com a justiça por vender cigarros em Nápoles sem
autorização: A multa de 28 mil tornou-se um débito judicial de 50 mil devido ao
descaso dela e do marido –que tentam burlar a lei para contornar suas conseqüências.
Enquanto estiver grávida Adelina está preferencialmente isenta de complicações
como a cadeia. Ao contrário do que costuma acontecer, porém, a sucessão de
gravidez (ela chega a ter sete filhos ao longo dos anos!) deixa Adelina mais
bonita e formosa, seu marido Carmine, por outro lado, vai ficando cada vez mais
exausto e combalido.
Dedicado ao “Ontem”, este primeiro conto,
ambientado no pós-guerra, é uma grata surpresa ao mostrar De Sica se despindo
de comiseração para narrar com lirismo uma circunstância que, sob outro prisma
(leia-se, no Movimento Neo-Realista de outrora), seria periclitante.
No segundo episódio, “Anna”, acompanhamos a
personagem de Sophia percorrendo Milão a bordo de um rolls royce na companhia
de seu perplexo amante Renzo. A despeito da flagrante inaptidão dela para
dirigir é ele quem bate o carro numa estrada quando assume o volante. As
primeiras desavenças do casal brotam aí, mas revelam-se tão vazias quanto o
diálogo amistoso que antes travavam.
Representando o “Hoje”, este episódio passado
no tempo atual do filme exala certa displicência no registro fútil que faz dos
personagens, embora isso não deixe de depor a favor da própria proposta que
parece se construir –uma espécie de Antonioni sucinto temperado de gracejo.
No último episódio, “Mara”, Sophia vive uma
garota de programa em Roma que recebe seus clientes no próprio apartamento. O
mais assíduo deles, Augusto (Mastroianni) vive às turras com o pai e, mesmo
declarando sua paixão à Mara o tempo todo, não consegue deixar suas neuroses do
lado de fora da porta. O apartamento vizinho ao de Mara pertence a uma senhora
idosa que a repudia constantemente, mas seu neto Umberto (Gianni Ridolfi), um
jovem seminarista, teve sua convicção no celibato seriamente abalada desde a aparição da exuberante vizinha.
Entre as visitas sôfregas e titubeantes de
Augusto e os ocasionais contatos com um maravilhado Umberto –sendo que os dois freqüentemente
atrapalham um ao outro –Mara busca levar a vida com graça e certa dignidade.
Se os episódios anteriores são o “Ontem” e o
“Hoje”, este então seria o “Amanhã”, mas de que maneira? Uma possibilidade
seria a sugestão de De Sica, na homenagem que pratica neste conto, de que o
“cinema do amanhã” seria o de realizadores vanguardistas como Luis Buñuel, que
parece ter seu “O Discreto Charme da Burguesia” homenageado aqui, na galhofa
ácida e sarcástica do interlúdio sexual que nunca se concretiza, atrapalhado
por outras circunstâncias. O filme em si é menos um afastamento do diretor De
Sica das orientações dramáticas que o consagraram e mais uma prova de seu
talento na capacidade de se mostrar hábil em diferentes gêneros e temas.
Ah, e a cena do striptease
de Sophia Loren presente neste último episódio é um dos grandes momentos da
carreira da atriz e da própria história do cinema italiano.
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