Início da cultuada “Trilogia do Inferno”, do
italiano Lucio Fulci, este trabalho vem impregnado de toda a concepção de
estilo que por vezes o define como Mestre do Gore; sua obsessão exultante por
efeitos de maquiagem expostos com exuberância pela fotografia.
Há também uma ligeira desconstrução do código
que rege o sub-gênero dos mortos-vivos que parece nunca ter sido tentada por
outros realizadores.
Ambientada nos EUA –a despeito do elenco e da
equipe técnica ser majoritariamente italiana –a trama começa em Nova York, numa
sessão mediúnica durante a qual a jovem Mary (a bela Katherine McColl, presente
em todos os filmes que constituem a “Trilogia do Inferno”) tem uma visão em
princípio enigmática, um padre num cemitério enforcando-se diante de uma
sinistra inscrição em uma lápide.
A despeito desse personagem, o padre Thomas
(Fabrizio Jovine), ser o antagonista do filme não nos são fornecidas maiores
razões para o seu suicídio, e a condução de Fulci, calejada pelos subterfúgios
do ‘giallo’, saberá muito bem ocultar tais lapsos.
Eis que tal visão (que inclui a aparição de
zumbis emergindo de suas covas) leva Mary a aparentemente ‘morrer de susto’ –ao
menos é essa explicação que os legistas desleixados fornecem –e seu corpo é
enviado para ser enterrado.
Nessa ocasião, o inconformado investigador Bell
(Christopher George) divide suas dúvidas com a displicência de dois coveiros
quando tem a impressão de ouvir gritos: Mary, na verdade, continua viva (!) e
despertou, absolutamente em pânico dentro do caixão –numa cena que a narrativa
de Fulci torna aflitiva!
Sua visão é, pois, uma espécie de profecia: O
ato do padre liberou as portas do inferno e, onde quer que seja essa cidade,
Dunwich, será a partir dela que os zumbis reanimados começarão a dominar a
terra.
Paralelamente, sabemos que isso já está
acontecendo: Em Dunwich, vemos a perplexidade do psiquiatra Jerry (Carlo De
Mejo) e de alguns outros membros da população ao constatar aparições macabras
desses zumbis –materializados em toda a paixão incontida de Fulci por materiais
gosmentos, sangue, vísceras e germes. Vemos também que o padre Thomas tornou-se
uma espécie de líder desses zumbis –apresentando alguns poderes inexplicados –e
que, embora tenham as características relativamente fiéis aos zumbis originais
concebidos por George Romero, eles podem aparecer e desaparecer, tal qual
manifestações fantasmagóricas, o que os ajuda a capturar inúmeras vítimas de
surpresa.
Quando Mary e Bell enfim descobrem a
localização de Dunwich e por lá aparecem, o filme de Fulci já está apresentou
situações sobrenaturais o bastante para alarmar qualquer um, exigindo dos
heróis uma atitude imediata: E que vem a ser a destruição do corpo do padre
Thomas sepultado em sua cripta –uma solução súbita e banal que fragiliza muito
o roteiro concebido por Fulci e Dardano Sacchetti.
Prejudicado por diversas
incoerências na estruturação de sua trama e beneficiado pela técnica impecável
de sanguinolência visual que tornou seu diretor célebre, “Paura Nella Citta’
Dei Morti Viventi” (no seu título original) se equilibra entre esses dois
extremos –o de sua inconstância para com a lógica e de sua qualidade enquanto
realização técnica –sendo lembrado pelos apreciadores do gênero por muitas de
suas sequências, dentre as mais violentas do gênero e certamente as melhores
dessa trilogia concebida por Fulci, como as cenas em que o poder dos zumbis leva algumas vítimas a verter sangue pelos olhos ou quando uma broca perfura a
cabeça do ator Giovanni Lombardo Radice, um dos membros do elenco de
“Holocausto Canibal”.
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