segunda-feira, 20 de abril de 2020

Apocalypse Now Redux

Lançado no Festival de Cannes de 2001, durante o advento das ‘versões especiais do diretor’ de filmes em DVD, “Apocalypse Now Redux” representava um novo e diferenciado corte de Francis Ford Coppola em relação à sua obra-prima lançada em 1979.
O “Apocalypse Now” que todos conheciam, e que não tardou a converter-se numa marco fundamental do cinema, era um cópia bruta, despida de cenas que, segundo Coppola, acrescentavam novas camadas à trama; dessa forma, esta versão “Redux” era inusitadamente acrescida por quase uma hora de material inédito que, segundo o próprio Coppola, tinha o mérito de tornar mais ágil o material.
O filme que começa é o mesmo e magistral de sempre: Ao som apoteótico e apropriadamente dramático de “The End”, do The Doors, somos apresentados ao Capitão Willard (Martin Sheen) e às suas neuroses –no Vietnam, ele anseia por voltar para casa; quando em casa, ele sente falta da guerra.
Logo, ele recebe uma missão para ocupar sua mente transtornada: Deve subir um rio até adentrar o Camboja a bordo de um barco militar, infiltrado entre a tripulação, e uma vez lá eliminar o mítico Coronel Kurtz (Marlon Brando), um oficial extremamente graduado que enlouqueceu em regiões muito distantes da civilização, e lá montou um império particular.
As primeiras diferenças em relação ao filme original surgem logo após a espetacular cena do bombardeio ao som de “A Cavalgada das Valquírias”, quando Willard (um personagem sem expressões de sarcasmo na outra versão) convence os soldados a roubarem a prancha de surf do megalomaníaco oficial interpretado por Robert Duvall. Na sequência, a cena do show das coelhinhas da Playboy ganha um formidável e aprofundado acréscimo quando Willard e os outros recrutas reencontram as garotas num acampamento militar decadente transformado praticamente em prostíbulo.
Contudo, o trecho que realmente justifica a existência desta versão “Redux” é mesmo o imenso bloco de quase uma hora de duração, lá pelo início do terço final, onde Willard encontra uma fazenda mantida por militares franceses em pleno Vietnam –cena apelidada pelo diretor de “Fantasmas de Buñuel” –onde os protagonistas encontram personagens aprisionados pela própria irredutibilidade de sua ideologia.
O interlúdio de Willard com a bela moradora do lugar (Aurore Clément, de “Paris, Texas”) introduz uma inesperada dose de erotismo na ópera bélica de Coppola.
Todo seu trecho final, entretanto, manteve-se intocado (prova de que realmente não havia como tornar melhor e mais antológica toda aquela passagem), quando Willard e o que sobrou de sua tripulação, triturados pela loucura, chegam ao extremo de não-civilização onde reina Kurtz, ameaçador e icônico como só um monstro como Marlon Brando seria capaz de interpretar.
Concebido como uma livre adaptação do livro “O Coração das Trevas”, de Joseph Conrad –transpondo da ambientação da África colonial do Século XIX para a Guerra do Vietnam –o filme de Coppola é uma surreal jornada de pesadelo filosófico, materializada após dois anos infernais de filmagens caóticas. A versão original e oficial até então conhecida era de uma perfeição e de um assombro que dificilmente uma nova releitura seria capaz de ombrear; e, de fato, “Redux” embora fascine por trazer novos adendos à uma narrativa tão hipnótica não consegue retocar o que já era irretocável –as cenas novas esticam consideravelmente a experiência afetando-lhe o ritmo, que na versão original transcorria com exatidão e fluidez.

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